quinta-feira, 15 de maio de 2014

20140515 Max Freedom Long Milagre da ciência secreta Cap. 1


 

MAX FREEDOM LONG

O MILAGRE DA CIÊNCIA SECRETA


Título do original, inglês
“Secret science behind miracles”
Copyright 1961 de  Max Freedom Long
 
 

 

 

 

 

 


CAPITULO I

 

A descoberta que pode modificar o mundo

 

Estranhas histórias dos kahunas (guardiães do segredo).

 

Historia da magia polinésia.

 

Chegada do homem branco.

 

Fracasso da magia do homem branco e proibição

 

Da magia dos kahunas.

 

Cristianismo versus huna.

 

Dr. William Tufts Brigham, conservador do “Bishop Museum”.

 

40 anos de pesquisas por Dr. Brigham e seus resultados.

 

Três princípios básicos para compreender Huna.

 

A chave do segredo.

 

Unihipili e uhane, subconsciente e consciente.

 

Experiências de William Reginald Stewart na África.

 

As doze tribos da áfrica ligadas aos polinésios através dos seus ritos.

 


Um relato interessante e impressionante ao mesmo tempo.
Nesta noite que iniciei a leitura não consegui parar até o final deste primeiro capítulo.
Além de tudo Long escreve bem. Prende o leitor. A mim pelo menos.
 
Paulo Cesar Fernandes
 

 

 


CAPITULO I

 

 

Esta narrativa reporta fatos inerentes a um antigo e secreto sistema de prática de magia, o qual, se pudermos conhecer, como conseguiram os mágicos nativos da Polinésia e da África do Norte, poderá modificar o mundo desde que a bomba atômica não torne impossíveis todas as demais modificações.

 

Quando rapaz ainda jovem, fui Batista. Frequentei a Igreja Católica com um amigo de infância, muitas vezes. Mais tarde, estudei Ciência Cristã rapidamente, dei uma olhadela na Teosofia e terminei fazendo um exame de todas as religiões, cujas literaturas estivessem ao meu dispor.

 

Com esta bagagem de conhecimentos, tendo conseguido graduar-me em Psicologia, cheguei ao Havaí em 1917, e aceitei um emprego para lecionar, porque assim ficaria perto do vulcão Kileauea, que estava em atividade naquele tempo e eu me propunha visitá-lo tantas vezes quantas fossem possíveis.

 

Depois de uma viagem de três dias num pequeno vapor, fora de Honolulu, finalmente, cheguei à minha escola. Compunha-se esta de três salas e ficava num vale solitário, entre uma plantação de açúcar e um enorme sítio, onde trabalhavam havaianos, mas que era propriedade de um homem branco, o qual vivera a maior parte de sua vida em Havaí.

 

Os dois professores sob a minha direção eram havaianos e, assim, era natural que em breve começasse, a saber, mais e mais acerca dos seus amigos havaianos. Desde logo comecei a ouvir discretas referências aos mágicos nativos, os "kahunas", ou "donos do Segredo".

 

Minha curiosidade foi aumentando e passei a querer saber mais. Para minha surpresa, verifiquei que as perguntas não eram recebidas de bom grado. Atrás da vida nativa parecia existir ma região de segredo e atividades privadas, que não eram disponíveis para um estrangeiro curioso. Ademais, aprendi que os "kahunas" haviam sido postos fora da lei desde quando os missionários cristãos se tornaram os legisladores das Ilhas; por isso todas as atividades dos "Kahunas" e seus clientes eram estritamente ocultas, pelo menos quanto aos homens brancos.

 

As recusas só serviram para estimular meu apetite por este esquisito manjar com sabor de superstição negra, condimentado, porém, e constantemente, para queimar a língua, com o que parecia ser, conforme diziam testemunhas oculares, mesmo impossível, ou absurdo.

 

Os fantasmas passeavam escandalosamente e não eram apenas fantasmas restritos aos havaianos já mortos. Os deuses inferiores também passeavam e supunha-se que Pele, deusa dos vulcões, visitasse repetidas vezes os nativos, tanto de dia como de noite, disfarçada numa velha exótica, nunca vista naquelas paragens, sempre a pedir tabaco, o que lhe era dado, sem qualquer relutância.

Havia, então, os casos de cura através do uso da magia, as mortes mágicas de pessoas culpadas que feriram seus companheiros, e, o mais estranho para mim, o uso da magia para investigar o futuro dos indivíduos, modificando-o para melhor, caso não fosse o desejado. Esta última prática possuía um nome havaiano, contudo, foi descrita para mim como "Faça Bom Negócio".

 

Formara-me, eu, numa escola austera, e, portanto, estava inclinado a olhar com suspeita toda e qualquer coisa que se parecesse com superstição. Esta minha atitude foi reforçada quando recebi, da Biblioteca de Honolulu, o empréstimo de vários livros que diziam o que havia para ser dito sobre os "kahunas". Isto havia sido quase inteiramente escrito pelos missionários que chegaram ao Havaí, menos de um século antes e os "kahunas" nada mais eram que um bando de maus elementos que se valiam das superstições dos nativos. Antes da chegada dos missionários, em 1820, havia grandes plataformas de pedra, ao longo das oito ilhas, com ídolos grotescos de madeira e altares de pedra, onde até sacrifícios humanos eram levados a efeito. Havia ídolos peculiares a cada tempo e a cada localidade. Muitas vezes os chefes tinham seus ídolos próprios e pessoais, como o famoso conquistador de todas as Ilhas, Kamehameha I, tinha o seu detestável deus da guerra, de olhos parados e dentes de tubarão.

 

Perto da minha escola, num distrito onde fui mais tarde Iecionar, todos os anos os sacerdotes se punham em procissão, carregando os deuses em viagem de férias pelo campo e arrecadando tributos.

 

Uma das notáveis atrações da adoração do ídolo era o surpreendente conjunto de tabus imposto pelos "kahunas". Quase nada podia ser feito sem o levantamento do tabu e a permissão dos padres. Como as decisões tomadas pelos padres eram sustentada pelos chefes, o povo levava uma vida difícil. De fato, tais foram às imposições desses padres que, no ano anterior ao da chegada dos missionários, o "kahuna" chefe, por nome Hewahewa, pediu à velha rainha e ao jovem príncipe reinante permissão para destruir os ídolos, quebrar os tabus até o último, e proibir os kahunas de suas práticas. A permissão foi concedida e todos os kahunas de boa vontade juntaram-se para queimar os deuses que eles sempre conheceram e que eram apenas madeira e plumas.

 

Os livros ofereceram-me leitura fascinante. O sumo sacerdote Hewahewa, fora, evidentemente, um homem genial. Ele havia possuído forças psíquicas e havia sido capaz de prever o futuro, ao ponto de aconselhar Kamehameha I sabiamente, através de uma campanha que durou anos, terminando com a conquista de todos os outros chefes e a unidade das Ilhas sob uma só lei.

 

Hewahewa foi um excelente exemplo do tipo dos havaianos da classe elevada que possuíam a habilidade de absorver idéias novas e de reagir contra elas. Esta classe surpreendeu o mundo saindo da saia de palha para os vestuários dos povos civilizados, em menos de uma geração.

 

Parece que Hewahewa passou cerca de cinco anos fazendo sua transição pessoal de pensamento e de costumes nativos para aqueles dos homens brancos da época. Todavia, ele cometeu um grave erro no processo

 

Quando o conservador Kamehameha I morreu, Hewahewa se pôs a trabalhar na previsão do futuro e o que ele viu, intrigou-o sobremaneira. Viu brancos chegando ao Havaí com suas esposas, com a intenção de falar aos havaianos sobre o seu Deus. Viu um local em certa praia, numa das oito ilhas, onde eles aportariam para encontrar a realeza.

 

Para o sumo sacerdote, isto era da maior importância. Evidentemente, procedeu a um inquérito junto aos marinheiros brancos então nas ilhas, tendo sido informado de que os padres brancos adoravam a Jesus, o qual os havia ensinado a fazer milagres, até mesmo ressuscitar os mortos e que, Ele mesmo, Jesus, havia ressuscitado ao terceiro dia. Sem dúvida, a história foi adequadamente tecida e adornada para benefícios dos havaianos.

Convencido de que os brancos possuíam meios superiores, armas, navios e máquinas, Hewahewa tomou por certo de que eles eram donos de uma fórmula de magia superior. Ciente do contágio que havia atingido as premissas do kahunaismo nas Ilhas, ele, prontamente, decidiu limpar o caminho para a chegada dos kahunas brancos.

 

Imediatamente, entrou em ação. Os templos estavam todos em ruínas quando, num dia de Outubro de 1820, no mesmo local e na mesma praia que Hewatewa vaticinara aos amigos e à família real, os missionários da Nova Inglaterra aportaram.

 

Hewahewa foi ao encontro dos missionários brancos na praia, recitou-lhes uma bela oração de boas vindas, em rima, que havia composto em honra deles. Na oração, mencionou uma boa parte da magia nativa, — em termos velados — para mostrar que ele era um mago de insignificantes forças, sempre desejando as boas vindas aos novos padres, bem como aos seus "deuses dos mais elevados graus".

 

As visitas oficiais à realeza terminaram e os missionários foram designados para as várias Ilhas, com permissão para começar os seus serviços, sendo Hewahewa eleito para seguir com o grupo de Honolulu. Contudo, ele já se havia visto em má situação, porque, conforme logo se tornou público, os kahunas brancos não possuíam magia alguma.

 

Eram tão desvalidos quanto os deuses que haviam sido queimados. Os cegos, os doentes e os aleijados haviam sido trazidos perante eles, e foram levados de volta, ainda cegos, ainda doentes, ainda aleijados. Algo estava errado. Os kahunas eram capazes de fazer muito mais, com ídolos ou sem ídolos.

 

Fez-se notório que os kahunas brancos precisavam de templos. Esperançosamente, Hewahewa e seus homens se dispuseram ao trabalho, para ajudar a construir um templo. Foi um belo e enorme templo, obra de cantaria, que demorou muito para ser construído. Porém, quando, por fim, a obra foi terminada, ofertada e dedicada, os missionários ainda não podiam curar, ainda nada podiam dizer quanto à ressurreição dos mortos como era esperado.

 

Hewahewa alimentara os missionários e se mostrara infinitamente amigo. Seu nome aparecia frequentemente em cartas e jornais. Porém, logo depois que a Igreja de Waiohinu foi fechada, seu nome desapareceu dos relatórios dos missionários. Ele fora instado para converter-se e juntar-se à Igreja. Recusou e apenas podemos supor que tenha voltado à sua magia, emitindo ordens aos seus companheiros. Alguns anos mais tarde, com a Cristandade cantando seus hinos, lendo e escrevendo, sendo aceita pelos chefes, em sua rápida marcha para a civilização, os missionários, puseram os kahunas fora da lei. E eles permaneceram fora da lei, mas, como nenhum oficial da polícia havaiana ou magistrado, em juízo perfeito, se atreveria a mandar para a prisão um kahuna conhecido como possuidor de forças genuínas, o uso da magia continuou jocosamente, nas costas dos brancos, por assim dizer. Entrementes, escolas foram fundadas e os havaianos evoluíram da selvageria para a civilização com incrível rapidez, indo à Igreja aos domingos, cantando e rezando tão alto quanto o próximo, e, às segundas-feiras, indo ao diácono, o qual poderia ser um kahuna, em dias de semana, para serem curados ou para modificarem o seu futuro, caso se achassem numa corrente de má sorte.

 

 

Nos distritos isolados, os kahunas praticavam suas artes mágicas abertamente. No vulcão, muitos deles continuavam a fazer suas oferendas rituais a Pele, e trabalhavam, como guias de turistas, deixando-os pasmados, inúmeras vezes, com uma certa façanha de magia, da qual me ocuparei detalhadamente, muito em breve.

 

 

Para continuar minha história, li os livros, concluí com os seus autores que os kahunas nada possuíam de magia e acomodei-me totalmente satisfeito com a resolução de que todo e qualquer conto murmurado aos meus ouvidos seria mero produto de imaginação.

Na semana seguinte fui apresentado a um jovem havaiano que havia estado na escola e que havia pensado em mostrar seus conhecimentos superiores, desafiando a superstição nativa de que ninguém poderia entrar na ruína de um determinado templo para profaná-lo. Sua demonstração tomou um rumo inesperado e ele se deu conta de que não mais podia fazer uso das pernas, pois perdera o controle sobre elas. Amigos carregaram-no para casa, depois que ele, sozinho, se ter arrastado para fora das ruínas. Então, quando falhou o médico local, um kahuna foi procurado, tendo este último restabelecido o tal jovem. Não acreditei na história, mas, ainda assim, eu não possuía meios de conhecer o que eu queria.

 

 

Indaguei de alguns brancos mais velhos da vizinhança o que eles pensavam dos kahunas, e eles, invariavelmente, me aconselhavam a manter o meu nariz longe de seus afazeres. Perguntei aos havaianos de certa cultura e não recebi resposta. Estes, simplesmente, não falavam. Riam de minhas perguntas ou tratavam de ignorá-las.

Este estado de coisas prevaleceu durante todo aquele ano, bem como no seguinte e no seguinte. Mudava-me para uma nova escola, cada ano que passava, de todas as vezes encontrando-me a mim próprio em cantos isolados, onde a vida nativa corria intensa e oculta. No terceiro ano, encontrava-me numa pequena, mas buliçosa comunidade de plantação de café, com seus sitiantes e pescadores nativos, pelos morros e ao longo das praias.

 

 

Bem depressa fiquei sabendo que a agradável senhora, apesar de idosa, com quem eu contratara refeições num pequeno hotel de segunda classe, exercia o cargo de Ministro e pregava todos os domingos para a maior congregação de havaianos naquelas paragens. Soube ainda que ela não tinha nenhuma ligação com as Igrejas da Missão ou outra qualquer, ordenara-se a si própria e era irascível sobre o assunto. No devido tempo, descobri que ela era filha de um homem que se havia aventurado a experimentar suas orações e fé cristã contra a magia de um kahuna local que o havia ameaçado de lançar a oração da morte sobre a sua congregação de havaianos, um por um, para mostrar que suas crenças eram mais práticas e genuínas do que as superstições dos Cristãos.

Vi até o diário daquele solene e sério, porém mal orientado cavalheiro. Nesse diário, estavam relatadas por ele, as mortes dos membros de sua tribo, um por um, seguidas da brusca deserção dos remanescentes. Naquele ponto, as páginas do diário permaneceram em branco por muitos dias, porém, a filha contou-me como o desesperado missionário se pôs a campo, aprendeu o uso da magia empregada na oração da morte, e, secretamente, fez a oração da morte para o kahuna ameaçador. O kahuna não esperava a reviravolta e não havia tomado precauções contra possível ataque. Morreu em três dias.

Os sobreviventes da tribo voltaram depressa para a Igreja... e o diário resumiu as anotações felizes do retorno. Mas o missionário nunca mais foi o mesmo. Assistiu ao próximo conclave do corpo missionário em Honolulu e, ao que parece, disse ou fez coisas que não foram registradas em lugar algum. Talvez ele tenha apenas respondido acusações escandalizadas. De qualquer maneira, ele era da Igreja e nunca mais assistiu a um conclave. Os havaianos, contudo, entenderam. Uma princesa deu-lhe uma nesga de terra de meia milha de largura desde as vagas do mar até às montanhas. Na praia desta terra, onde o Capitão Cook aportou e foi morto mais ou menos cinqüenta anos antes, estavam localizadas as ruínas de um dos melhores templos nativos do lugar aquele mesmo de onde os deuses eram trazidos todos os anos em procissão, pela estrada que ainda hoje é chamada "O Caminho dos Deuses". Mais para longe da praia, porém, no mesmo terreno, ficava a pequena Igreja de pedra coral que os nativos haviam construído com suas próprias mãos e na qual a agradável senhora presidira como Ministro, sessenta anos mais tarde.

 

 

No começo do meu quarto ano nas Ilhas, mudei-me para Honolulu e depois que me instalei, reservei um certo tempo para fazer uma visita ao Museu do Bispo, uma famosa instituição fundada pela Realeza Havaiana e destinada a sustentar uma escola para crianças de sangue havaiano.

 

 

A finalidade da minha visita era tentar localizar alguém que pudesse dar-me respostas autorizadas para as perguntas que me atormentavam há tanto tempo sobre os kahunas.

 

 

Meu arroubo de curiosidade havia aumentado tanto que já se tornava desconfortável e, então, plantei dentro de mim o inabalável desejo de obter qualquer coisa sobre o assunto, de um jeito ou de outro, definitiva e decididamente. Eu ouvira que o curador do Museu passara a maior parte dos seus anos desenterrando coisas havaianas e tinha esperança de que ele estivesse em condições de dizer-me a verdade, fria e cientificamente, de uma forma aceitável.

 

 

À entrada, encontrei uma atraente mulher havaiana, Sra. Webb, a qual ouviu as minhas afirmações cheias de franqueza, a razão da minha visita, estudou-me por um momento e disse: "É melhor que o Sr. suba e fale com o Dr. Brigham. Ele está no escritório, no andar superior".

 

 

O Dr. Brigham saiu da sua escrivaninha, onde parecia estar estudando algum material de botânica, através de um vidro, para me observar com seus amigáveis olhos azuis. Ele era um grande cientista, uma autoridade em seu campo favorito, reconhecido e respeitado no Museu Britânico, pela perfeição dos seus estudos e relatos impressos sobre a matéria estudada. Já estava com oitenta e dois anos de idade, era enorme, calvo e barbado. Seu peso equivalia ao tamanho da incrível massa variada de conhecimento científico que possuía... e parecia um Papai Noel. (Ver Quem é Quem na América — 1922/1923, sob o título William Tufts Brigham).

 

 

Aceitei a cadeira que ele me ofereceu, apresentei-me e deslizei para as perguntas que me haviam trazido ali. Ouviu-me atentamente, perguntou-me sobre as coisas que eu havia ouvido, os lugares onde eu havia morado e as pessoas que eu conhecera. Às minhas perguntas sobre os kahunas, ele opôs as suas para descobrir quais as conclusões a que eu havia chegado. Expliquei que estava inteiramente convencido de que tudo era superstição, sugestão ou veneno, porém, admiti que precisava de alguém que pudesse falar com a autoridade da informação fidedigna, para ajudar-me a aquietar a irritante duvidazinha que pairava no fundo da minha mente.

 

 

Algum tempo passou. O Dr. Brigham quase me aborreceu com as suas perguntas. Ele parecia esquecer o propósito da minha visita e perdeu-se a si próprio na exploração do meu preparo. Quis saber onde eu havia estudado, o que eu havia lido, e o que eu pensava sobre uma dúzia de assuntos que nada tinham a ver com a questão formulada por mim.

 

 

Eu estava começando a ficar impaciente quando ele, de repente, fixou-me com um olhar tão severo que eu até me assustei.

 

 

— Posso confiar em você para respeitar minhas confidências? — perguntou. — Tenho um certo renome científico que desejo preservar; — sorriu subitamente e adiantou — mesmo pela vaidade da minha idade avançada.

 

 

Assegurei a ele que tudo quanto me dissesse não iria além do que então esperava. Pensou por um momento e depois disse vagarosamente:

 

 

— Há quarenta anos eu estudo os kahunas procurando encontrar uma resposta para a pergunta que você acaba de fazer. Os kahunas, de fato, usam o que você chamou de magia. Eles, de fato, curam. Também matam. Podem prever o futuro e mudam-no para os seus clientes. Muitos deles eram impostores, mas alguns

eram honestos. Alguns deles até usavam esta magia para o "passeio sobre o fogo", através das torrentes de lavas, apenas suficientemente resfriadas para que aguentassem o peso de um homem. — Interrompeu-se de súbito como se temesse haver dito muito.

 

 

Tombando para trás na sua cadeira giratória, o Dr. Brigham me observou um tanto deprimido, com os olhos semi-cerrados.

 

 

Não tenho certeza, mas acredito que murmurei "obrigado". Tentei um pouco levantar-me da cadeira e afundei-me novamente. Devo tê-lo fixado por um tempo bastante longo para um idiota. Meu problema não era haver vento em minhas velas. Estava pasmado.

 

Ele havia abalado as escoras postas debaixo do mundo que edificara por um período de três anos. Confiantemente, eu havia esperado uma negativa oficial para os Kahunas e havia dito a mim mesmo que, algum dia, eu ainda iria lavar as minhas mãos das suas superstições, de uma vez por todas. Agora, estava eu de volta, perdido na lama, não apenas atolado até os tornozelos como antes, porém, muito mais, afundando até a ponta do nariz, cheio de curiosidade atrás do mistério.

 

 

Talvez eu tenha emitido sons desarticulados; não estou certo, mas, finalmente, consegui achar a minha língua.

 

 

— "Passeio sobre o fogo"? — perguntei titubeante.

 

— Sobre a lava quente? Nunca ouvi tal coisa... — engoli em seco algumas vezes e depois consegui indagar:

 

— Como é que eles fazem isso?

 

 

Os olhos do Dr. Brigham pularam bem abertos, depois se apertaram, enquanto suas vastas sobrancelhas saltavam rumo à cabeça calva. Sua barba branca começou a mover-se num tique nervoso, e, súbito, ele tombou-se para trás na sua cadeira e soltou uma gargalhada que sacudiu as paredes. Riu até que as lágrimas rolaram-lhe pelas faces rosadas.

 

 

— Desculpe-me. — Ele sussurrou finalmente, colocando a mão apaziguadora sobre o meu joelho, enquanto desanuviava o olhar. — O motivo da sua pergunta me atingir de maneira tão engraçada é o fato de eu estar tentando respondê-la a mim próprio, há quarenta anos, sem resultado.

 

 

Com isso, quebrou-se o gelo. Apesar de ter a sensação de algo vazio e frustrado dentro de mim, como se tivesse jogado de volta bem no meio do problema, do qual eu pensava haver me livrado, passamos a conversar. O velho cientista tinha sido também professor. Ele possuía a prenda da simplicidade e das diretrizes, mesmo discutindo os mais complicados assuntos. Não me dei conta até que se passaram semanas, que, naquele momento, ele me havia posto as mãos em cima, reclamando-me como de Sua propriedade, como Elias procurando ajeitar o manto Sobre os meus ombros, antes de iniciar sua partida.

 

 

Disse-me mais tarde, que ele havia procurado um jovem a fim de treiná-lo na aproximação científica, a quem pudesse confiar o conhecimento adquirido nesse esquisito campo — o novo e inexplorado campo da magia. Muitas vezes, em alguma noite quente, quando percebia que eu estava para perder a coragem diante da impossibilidade de aprender o segredo da magia, ele dizia:

 

 

— Eu mal comecei. Só porque eu nunca saberei a resposta, não é razão para que você também não a saiba. Pense apenas no que aconteceu durante o meu tempo. A ciência da Psicologia nasceu! Conhecemos o subconsciente! Olhe para os novos fenômenos que estão sendo observados e reportados todos os meses, pelas Sociedades de Pesquisa Psíquica. Mantenha-se eternamente atento a eles. Nada diga quando você tenha encontrado uma solução ou quando alguma nova descoberta em psicologia o ajude a compreender porque os kahunas observam seus vários ritos, e o que vai pelas suas mentes quando eles os observam.

 

 

Outras vezes, haveria de abrir seu coração para mim. Era uma grande alma, ainda que simples. Ele possuía uma ansiedade quase infantil para conhecer o segredo dos kahunas e estava ficando muito velho. O tempo parecia querer findar-se antes que o sucesso viesse. Os kahunas falharam em conseguir que seus filhos e filhas fossem treinados e aprendessem o conhecimento antigo que lhes havia sido transmitido sob promessa de segredo inviolável, somente de pai para filho. Os que podiam curar ou "passear sobre o fogo" haviam desaparecido desde o ano de 1900 — muitos deles velhos e queridos amigos. Ele fora deixado quase sozinho num campo em que pouco havia para observar. Ademais, ele estava um tanto perplexo. Parecia tão absurdo pensar que ele havia sido capaz de apreciar o trabalho dos kahunas, havia se tornado amigo havia "passeado sobre o fogo" debaixo da proteção deles. — e ainda não havia conseguido o mais leve indício de como eles exerciam a sua magia, com exceção do caso da oração da morte, a qual, como explicou, não era verdadeiramente magia, mas um adiantado fenômeno de espiritualismo.

 

 

Algumas vezes, sentávamo-nos no escuro, com o defumador contra mosquitos queimando e então ele revia vários pontos, para se certificar de que eu me lembrava de tudo. Em muitas ocasiões, ele dizia ao finalizar:

 

 

— Fui capaz de provar que nenhuma das explicações populares da magia dos kahunas é de fonte digna de crédito. Não é sugestão ou qualquer outra coisa já conhecida em Psicologia. Usam algo que ainda temos que descobrir e isto é de inestimável importância. Simplesmente, devemos encontrar essa alguma coisa. Revolucionará o mundo se a pudermos encontrar. Mudará inteiramente o conceito da ciência. Trará ordem para o conflito das crenças religiosas. Vigie sempre três coisas no estudo desta magia. Deve haver alguma forma de consciência por detrás, dirigindo os processos de magia. O controle do calor no "Passeio sobre o fogo", por exemplo. Deve também existir alguma força exercendo esse, controle, isto se quisermos apenas reconhecê-lo. E, finalmente, deve existir alguma forma de substância, visível ou invisível, através da qual a força possa agir. Vigie sempre isto, e o que você puder encontrar dirigi-lo-á depois.

 

 

E, assim, gradativamente, apanhei o material que ele havia colecionado neste estranho campo novo. Tornei-me perfeitamente familiar a todas as negações, todas as especulações e todas as verificações. Comecei o lento trabalho de tentar achar kahunas remanescentes e fazer o que eu pudesse para aprender o Segredo deles. Ao ouvir a história do que algum kahuna havia feito, minha pergunta invariável seria: — "Quem lhe contou isso"? Começaria a regressão e, por vezes, seria mesmo capaz de achar a pessoa que havia sido o protagonista da história, conseguindo desta os menores detalhes do que havia sido feito. A maior dificuldade estava em conseguir uma apresentação ao kahuna que exercera a magia. Geralmente, isto era totalmente impossível. Os kahunas haviam aprendido, pelos golpes da adversidade, a evitar os brancos e nenhum havaiano se atreveria a trazer amigos brancos até eles, sem prévia permissão — e esta quase nunca era fornecida.

 

 

Quatro anos depois que encontrei o Dr. Brigham, ele morreu, deixando-me com um peso no coração e com a receosa certeza de que eu talvez fosse o único homem branco no mundo que sabia o suficiente para continuar as investigações da magia nativa que estava desaparecendo tão rapidamente. E, se eu falhasse, o mundo poderia perder para sempre um sistema prático, que seria de infinito valor para a humanidade, se pudesse ser recuperado. Com o Dr. Brigham, eu havia estado vigilante na esperança de alguma nova descoberta em Psicologia ou no campo da Ciência Psíquica, e, desanimadoras como eram as notícias, fora forçado a admitir que ambas as ciências apresentavam sinais de estagnação.

 

 

Com mais de uma centena de reconhecidos cientistas, ocupados por um período de mais de meio século em Pesquisas Psíquicas, nem uma única teoria havia sido elaborada, que pudesse explicar mesmo coisas simples como telepatia ou sugestão, já para não falar em ectoplasma, incorporações e materializações.

 

Mais anos se passaram. Cessou o progresso e, em 1931, admiti a derrota. Foi então que deixei as Ilhas.

 

 

Na Califórnia, continuei a esperar ansiosamente por alguma nova descoberta psicológica que pudesse, outra vez, levantar o problema. Nenhuma apareceu. Então, em 1935, inesperadamente, acordei no meio da noite com uma idéia que me conduziu diretamente a uma solução que talvez contivesse a resposta.

 

 

Se o Dr. Brigham fosse vivo, com certeza, ter-se-ia juntado a mim, embaraçado e num acesso de rubor. Nós ambos havíamos passado por cima de uma solução tão simples e tão óbvia que poderia escapar continuamente sem ser notada.

 

 

A idéia que me ocorreu naquela noite foi a de que os kahunas deviam possuir nomes para os elementos de sua magia. Sem os tais nomes, eles não poderiam ter passado seus conhecimentos de geração a geração. Como a língua que falavam era a havaiana, as palavras devem ter aparecido naquele idioma. Os missionários haviam começado a compilar um dicionário havaiano-inglês desde 1820 — o qual ainda estava em uso — e, como certamente, não haviam aprendido o suficiente acerca da magia nativa, para traduzir corretamente quaisquer nomes usados para descrevê-la, tornava-se óbvio que as traduções tentadas estariam falhas ou inteiramente erradas.

 

 

O idioma havaiano consiste de palavras formadas de radicais curtos. Uma tradução dos radicais daria, em geral, o significado original da palavra. Lia!... eu encontraria as palavras usadas pelos kahunas nas orações e cantos registrados e delas faria nova tradução, usando os radicais.

 

 

Na manhã seguinte, lembrei-me do fato de que, em Havaí, todos concordavam que os kahunas haviam ensinado que o homem possui dois espíritos ou almas. Ninguém prestara atenção ou valor a esta crença que se apresentava errônea. Como poderia um homem possuir duas almas? Que absurdo! Que negra superstição! Assim, eu pesquisei as duas palavras que representavam os nomes das duas almas. Conforme suspeitava, estavam ambas ali no meu velho dicionário, que saíra do prelo em 1865, alguns anos, depois da descoberta do Mesmerismo, durante os primeiros dias da Pesquisa Psicológica, e umas boas duas décadas antes do nascimento da nossa infantil ciência da Psicologia. O dicionário dizia:

 

 

“U-ni-hi-pi-li: Os ossos do braço e da perna de uma pessoa. Unihipili, era o nome de uma classe de deuses chamados akuanoho; Aumakua, era outro. Eram os espíritos de uma pessoa morta.

 

 

“U-ha-ne: A alma, o espírito de uma pessoa. O fantasma ou espírito de uma pessoa morta. Nota: Os havaianos supunham que os homens possuíam duas almas cada um; uma que morria com o corpo, a outra que vivia, visível ou invisível, como pudesse ser, porém, com a pessoa morta não tinha maior ligação do que a sombra dessa mesma pessoa. Estes fantasmas podiam falar, chorar, reclamar, etc. Existiam os que eram tidos como especialistas em amarrar ou agarrar estes fantasmas”.

 

 

Na pronúncia das palavras havaianas, o som das vogais é o mesmo usado em Latim.

Aparentemente, os ansiosos missionários haviam consultados os havaianos para se certificarem dos significados destas duas palavras e haviam obtido informações discrepantes, fazendo o possível para coordená-las e incluí-las nas traduções.

A importância do "unihipili” era que parecia estar ligado com os braços e as pernas definitivamente e, "além disso, era um espírito". O "Uhane", era também um espírito, porém, era um fantasma que podia falar, mesmo sendo pouco mais de uma sombra ligada com a pessoa "morta".

 

 

Como a primeira palavra era mais comprida e possuía maior número de radicais, comecei a trabalhar nela, a fim de conseguir uma tradução deles. Havia sete raízes na palavra, contando acréscimos de letras, e algumas destas raízes tinham até dez significados. Minha tarefa era proceder a uma seleção dos

significados, para ver se poderia encontrar algum que se aplicasse à magia usada pelos kahunas.

 

 

Cá estava o palheiro diante de mim e tudo o que eu precisava fazer era achar a minha agulha. Parecia um tanto promissor. Lembrei-me da recomendação do Dr. Brigham para vigiar sempre a consciência envolvida no "passeio sobre o fogo" e outras artes mágicas, a força usada para produzir os resultados e a substância psíquica, visível, ou invisível, através da qual a tal força agiria. Sim, eu tentaria achar três agulhas. (Eventualmente, eu as encontrei... as primeiras duas antes do fim do ano e, a última, seis anos mais tarde).

 

 

O que encontrei imediatamente, quase antes do almoço, foi o "Subconsciente", porém, não como nós o conhecemos. O subconsciente dos mágicos era duas vezes maior do que o normal e três vezes mais natural. Estava tão surpreso com a descoberta que resolvi contar até dez. Era incrível que os kahunas pudessem ter conhecido o subconsciente, porém, a evidência era inegável.

 

Aqui está como os radicais descreviam os espíritos denominados pelas palavras "unihipili" e "uhane":

 

 

Ambos são espíritos (u), e este radical significa causar sofrimento mental; assim, os dois espíritos podiam causar aborrecimentos.

 

Todavia, o radical "nane" em "uhane" significa falar; assim, o espírito denominado por esta palavra podia falar. Como somente seres humanos podem conversar, este espírito devia ser também humano. Isto faz surgir a questão quanto à natureza do outro espírito.

 

Pode ser causa de sofrimento mental e isto também podem os animais. Pode não ser um homem que possa falar, mas, pelo menos, é um espírito animal-semelhante que pode provocar má sorte. O "Uhane" chorava e conversava de modo fraco. O dicionário dizia que era considerado como nada mais sendo do que uma sombra ligada à pessoa morta.

 

Evidentemente, era um espírito fraco e não muito substancial "falador".

"Unihiipili", soletrando-se alternadamente "uhinipili", fornece mais radicais para traduzir. Combinados, conseguimos: Um espírito que pode causar aflição mental, porém, pode não ter aptidão para falar (u); é alguma coisa que cobre uma outra coisa a mais, escondendo-a; ou é esta última oculta por uma capa ou véu (uhi); é um espírito que acompanha outro, anexo a este ultimo; é adesivo e, assim sendo, cola-se ou adere ao mesmo. Anexa-se a si próprio a outro e age como seu servidor (pili); é um espírito que trabalha secreta, silenciosa e cuidadosamente, contudo não pratica certas coisas porque tem receio de ofender aos deuses (nihi); é um espírito que pode projetar-se de alguma coisa, levantar-se dessa alguma coisa e pode também tirar algo de algum lugar, como uma moeda de um bolso. Deseja certas coisas com a maior ansiedade. É teimoso e sem vontade própria, disposto a recusar fazer o que lhe for mandado. Toca, impregna ou se mistura completamente com algo mais. Está ligado com o vagaroso pingar de um líquido aquoso ou com a secreção e exudação do líquido alimentar, com o "líquido do seio" ou leite materno; (u — nos seus vários significados). (Nota: Mais tarde, eu aprenderia que "água" era o símbolo da força eletro vital humana, e, assim, achei uma agulha. Os dois espíritos conscientes do homem são dois terços de outra agulha. Mas o terceiro é apenas sugerido de maneira superficial, no significado das palavras "adesivo" ou "aderir").

 

 

Em suma, a idéia do consciente e do subconsciente dos kahunas parece ser, a julgar pelo sentido das palavras-raízes dos nomes dados a eles, um par de espíritos perfeitamente integrados num corpo, que é controlado pelo subconsciente e usado para cobrir e esconder a ambos! O espírito consciente é mais humano e possuía a habilidade de conversar. O torturante subconsciente verte lágrimas, goteja líquido aquoso e, por outro lado, transmite a força vital do corpo. Exerce o seu trabalho com cuidado secreto e silencioso, porém, é teimoso e disposto a recusar obediência. Nega-se a praticar algo, quando teme os deuses (retém um complexo ou fixação de idéias) e interpenetra ou toca o espírito consciente para dar a impressão de serem um só. (O uso na magia do elemento adesivo como um símbolo, e a habilidade de projetar-se ou tirar algo de algum lugar será esclarecido mais tarde).

 

 

Dada a certeza de que os kahunas haviam conhecido, por milhares de anos, toda a psicologia que nós só chegamos a aprender nos últimos poucos anos, certifiquei-me de que a habilidade de desempenhar façanhas de magia procedia do conhecimento de importantes fatores psicológicos, ainda não descobertos por nós.

 

Logo começou a aparecer que, ao dar nome aos elementos de psicologia e ao colocar nas suas palavras de origem os significados simbólicos para apontar os elementos relativos, os kahunas dos tempos áuricos, haviam feito um trabalho soberbo. O único grande bloco movediço era o fato de que as palavras símbolos permaneciam para elementos cuja natureza eu não podia imaginar.

 

Pesquisando febrilmente os significados destes símbolos, voltei aos relatórios dos Fenômenos Psíquicos e, à medida que revia cada tipo de fenômeno, esforçava-me para localizar os símbolos correspondentes nas origens dos termos usados pelos kahunas.

 

Após alguns meses, tornou-se patente que eu havia chegado ao máximo possível, na primeira tarefa de adaptar a mais completa psicologia com os ritos exteriores da magia kahuna. Cheguei à conclusão de que o que eu havia encontrado era por demais valioso para ocultá-lo do mundo e, imediatamente, escrevi um relatório sobre as minhas descobertas e o conhecimento dos kahunas em geral. (Recuperando a Magia Antiga, publicado pela Rider & Co, London, 1936).

 

A publicação inglesa trouxe-me muitas cartas. Eu havia colocado meu endereço no verso do relatório e havia pedido a todo e qualquer leitor que pudesse oferecer informações pertinentes ao estudo em causa, que me escrevesse. Quase nenhuma informação de real valia chegou, apesar de centenas de cartas conterem material especulativo e suposições.

 

 

Então, mais de um ano depois da publicação daquele livro, lá apareceu uma carta de um jornalista inglês aposentado. Seu nome era William Reginald Stewart e o que ele tinha a dizer era muito importante.

Ele estava muitíssimo interessado no meu relato por ter verificado que eu descrevia a mesma magia que ele, nos seus dias de juventude, havia encontrado em uso por uma certa tribo da Berbéria, nas Montanhas Atlas, ao Norte da África. Também, para sua maior surpresa, observou que as palavras havaianas usadas pelos kahunas, eram as mesmas, com exceção de diferenças de dialeto, que aquelas usadas para descrever a magia na África. Após ler o meu livro, ele havia feito uma busca nas suas notas amarelecidas pelo tempo e comparou as palavras que, conforme lhe haviam informado, pertenciam a uma linguagem de magia secreta. A palavra Havaiana "kahuna" aparecia como "quahuna" entre os Berberes e o termo havaiano para uma mulher kahuna, foi modificado de "kauna wahini" para "quahini". A palavra usada para um deus era aproximadamente a mesma nos dois idiomas: — "akua" e "atua" — assim como o eram um certo número de outras palavras que confrontamos.

 

 

Como as tribos Berberes, falavam um idioma em nada relacionado com os dialetos da Polinésia, a descoberta da similaridade de magia e de língua usada para descrevê-la, ofereceu provas definitivas de que os dois povos, ou provinham da mesma origem ou haviam estado em contato nos tempos antigos.

 

 

Stewart ouvira contar histórias desta tribo de Berberes e seus mágicos, enquanto explorava indícios de petróleo para uma companhia holandesa e correspondia com o Monitor de Ciência Cristã, como livre colaborador e autoridade no Norte da África.

 

Entrando em férias, contratou os serviços de um guia e partiu à procura da tribo.

 

Aconteceu que, de fato, ele encontrou a tal tribo, bem como "o mágico" que, no caso, era uma mulher. À força de muita persuasão, ele conseguiu fazer-se adotar como filho consangüíneo, a fim de obter os direitos de ser treinado na magia secreta. A mágica, cujo nome era Lucchi, tinha uma filha com a idade de dezessete anos, a qual estava justamente começando a receber treinamento e, assim, foi permitido a Stewart tomar parte no mesmo.

 

 

O treinamento começou com as explicações sobre a história das tribos legendárias, durante as quais foi ensinado que doze das tribos que possuíam kahunas viveram certa vez, no Deserto do Saara, quando este ainda era uma terra fértil e verde, cortada de rios.

 

Os rios secaram e as tribos mudaram-se para o Vale do Nilo. Uma vez lá, usaram sua magia para ajudar a cortar, carregar e colocar as pedras na construção da Grande Pirâmide. Naquele tempo, eles eram os legisladores no Egito e embriagaram todos os outros povos com a sua magia.

 

A história continuou com a declaração de como foi previsto que um período de escuridão intelectual era chegado para o mundo e que o Segredo da sua magia corria o perigo de perder-se. A fim de preservá-lo, as doze tribos decidiram sair em busca de terras isoladas, as quais se dirigiram para preservar o "Segredo" (Huna), até que o tempo se incumbisse de preparar a sua volta ao mundo. Onze dessas tribos, depois de fazerem uma exploração psíquica e descobrirem as Ilhas do Pacífico desabitadas, locomoveram-se, através de um canal, para o Mar Vermelho; daqui, ao longo da costa d'África ou pela Índia, atingiram o Pacífico. Após muitos anos perderam-se os da décima segunda tribo.

 

Esta, por alguma razão não esclarecida, decidira ir para o Norte e acampar nos fortes da Montanha Atlas. Haviam vivido lá por séculos, sempre preservando o "Segredo" e usando a sua magia, porém, como os tempos modernos chegaram, os kahunas haviam morrido todos, até que apenas um sobrevivia. Este último estava sendo representado pela Mestra Lucchi.

 

 

Stewart achou que a tribo Berbere era hospitaleira, esmerada, muito inteligente, e possuidora de uma bela e velha Cultura. Falavam uma língua conglomerada, peculiar às tribos Berberes, contudo, quando chegou a hora de transmitir o antigo conhecimento de magia, outro idioma teve de ser empregado, porque somente neste poderiam ser encontradas as palavras apropriadas para dar nome aos elementos que, no homem, tornavam a magia possível.

 

 

O jovem inglês estava já impedido pelas dificuldades da linguagem, tendo de adaptar o seu francês com aquele usado por alguns dos Berberes, tendo de se aprofundar Infinitamente, a fim de chegar a uma compreensão exata do que as palavras da chamada linguagem "Secreta" viriam a significar.

 

 

Pouco a pouco, ele aprendeu as bases filosóficas da magia. A Professora fizera muitas demonstrações de sua magia curadora, bem como no controle de pássaros, animais ferozes, serpentes e até de temperatura atmosférica. Tudo corria verdadeiramente muito bem, a parte teórica havia chegado ao fim, sendo que a parte prática iniciar-se-ia em seguida. Então, numa tarde confusa, dois grupos invasores no vale abaixo do acampamento dos Berberes começaram a guerrear-se entre si. Uma bala atingiu Lucchi no coração e ela morreu quase instantaneamente.

 

 

Sem professora e com a filha de Lucchi sabendo nada mais do que ele próprio, Stewart deu por encerrado o seu treinamento de maneira brusca. Apanhou suas anotações, despediu-se dos seus irmãos e irmãs, voltando às suas velhas ocupações.

 

Trinta anos mais tarde, leu o meu relato e reconheceu as palavras havaianas mencionadas por mim, como sendo as mesmas que ele havia preservado durante tanto tempo em suas notas — exceção feita às mutações de dialeto.

 

Isto ligou os kahunas havaianos com a África do Norte e possivelmente com o Egito. As lendas havaianas continham a história falada do povo. Nestas, é contado que os havaianos, certa vez, moraram numa pátria distante. Viram, através de vistas psíquicas, a terra do Havaí e partiram à sua procura. Sua viagem começou no "Mar Vermelho de Kane", o que leva a crer tenham eles vindo do Egito, pelo Mar Vermelho, assim chamado em nossos dias, em pelo menos três idiomas. A história oferece poucos detalhes da jornada daquele ponto em diante, a não ser para narrar como prosseguiram de terra para terra, em grandes canoas duplas. Quando as oito ilhas do Havaí foram encontradas desabitadas pelas turmas de reconhecimento, estas voltaram às ilhas mais próximas do Oeste, a fim de levarem consigo o restante da tribo que lá permanecera para descanso. Árvores, plantas e animais foram transportados em viagens subseqüentes, à medida que a tribo se ia instalando no Havaí. As viagens às ilhas do exterior cessaram por longo tempo e a isolação completa reinou. Então, quando o sangue real se esgotou, uma viagem foi empreendida às outras ilhas, a fim de trazer de volta um príncipe de sangue azul. Este trouxe consigo as suas favoritas e um kahuna.

 

Este kahuna, se pudermos dar crédito à história, introduziu no Havaí uma forma contaminada de kahuanismos, o qual continha magia de pequena monta, e ordenou adoração aos ídolos, bem como a construção de templos. Esta contaminação permaneceu, com os seus ídolos e templos, apesar de haver kahunas conhecedores dos processos práticos de magia, os quais continuaram seu trabalho e preservaram seu "Segredo" numa forma quase genuína.

 

 

As tentativas dos estudiosos da matéria para delinear as origens havaianas, através dos costumes e da linguagem não foram muito bem sucedidas. Existem onze tribos de Polinésios, todas falando dialetos de um mesmo idioma, porém, algumas possuem palavras, costumes e crenças de fácil identificação como sendo de origem Indiana. Por outro lado, palavras polinésias podem ser encontradas dispersas desde o Pacífico até o Oriente Próximo. Madagáscar também as possui, indicando haver estado em contato com um povo que falasse a língua Polinésia. Até no Japão, podem ser encontradas palavras e idéias Polinésias. Na Índia, pode ser observado um certo número de idéias ligadas com a magia kahuna, bastante modificadas e sem uso prático no momento, porém, ainda apontando para a mesma e geral diretriz.

 

 

Com o inestimável auxílio prestado por Stewart e fazendo inteiro uso do que ele havia aprendido no Norte da África, estava eu apto a continuar a pesquisa. Pouco a pouco o "Segredo" foi reconstruído, pois, seus símbolos e práticas foram adaptadas às observações dos atos exteriores ou ritos dos kahunas, feitas pelo Dr. Brigham e, em menor grau, por mim próprio.

 

 

Contudo, teria sido totalmente impossível assimilar os significados das palavras e dos ritos, não tivesse a moderna Psicologia e a Pesquisa Psíquica feito já certas descobertas básicas, sobre as quais repousassem maciças estruturas. As religiões também desempenharam papel de incalculável valor, porque, através delas, eu encontrei os remanescentes revolvidos da filosofia Huna original. Estes remanescentes, fora de forma como estavam, deram uma indicação de onde ir buscar os próximos informes, além de ajudarem a verificar outros materiais incertos à medida que eles surgiam.

 

Logo depois da publicação do meu livro, passei a corresponder com um padre da Igreja de Inglaterra, o qual me havia escrito imediatamente após a leitura da obra e que estava procedendo a estudos psicológicos sobre a cura mental e espiritual. Seu interesse acerca do conhecimento dos kahunas aumentou e pouco tempo depois do meu contato com Stewart, o clérigo e um grupo de seus associados decidiram fazer experiências com a magia de cura dos kahunas. Isto eles fizeram, depois de muita troca de correspondência.

 

Foram especialmente bem sucedidos em casos de obsessão. A família de um doente que fora curado, fizera uma oferta para financiar maiores experiências, e, assim, o clérigo e três de seu grupo empreenderam uma viagem à Califórnia, a fim de passar algum tempo comigo, discutindo sobre as melhores maneiras de prosseguir. Quando me deixaram, todos os planos estavam completos, até uma planta do edifício que deveria ser construído. Todavia, ao voltarem para a Inglaterra, estourou a segunda guerra mundial e os planos foram abandonados. Ao terminar a guerra, os fundos já não estavam mais disponíveis e o grupo curador dispersou-se.

 

 

Tais experiências, conforme executadas, provaram que a reconstrução do sistema Huna está suficientemente completa para ser praticada pelas mãos de indivíduos possuidores de certas faculdades naturais e em condições de poderem dedicar o tempo necessário para aprender a usar o tal sistema. Constante e continuada prática, sob orientação apropriada, parece ser a principal condição.

 

 

No Havaí, existe pouca ou nenhuma literatura digna de crédito a respeito dos kahunas.

 

O pouco que existe, disponível em livros, artigos e panfletos, negligência completamente os mecanismos básicos que eu relatarei. Cada autor contradiz os outros e o confuso problema nunca se esclarece.

 

Os meus próprios estudos, bem como os do Dr. Brigham são quase desconhecidos nas Ilhas e os exemplares do meu primeiro livro são conservados cuidadosamente trancados na Biblioteca de Honolulu, sendo tirados apenas quando requisitados por alguém que saiba que eles estão lá. Devido a concepções errôneas e ainda por causa do real perigo que se prestava antigamente a "oração da morte", a atitude geral dos residentes é um dos fatores que encorajam a negação da magia kahuna, ou, a não ser isto, a velha política de não se mexer com o que está quieto.

 

Com estas observações introdutórias, continuarei agora a minha tarefa de aprender o sistema Huna, em todos os seus detalhes e com as provas disponíveis quanto à sua exatidão, como sendo um conjunto prático de fatos científicos.

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Instigante.

Paulo Cesar Fernandes

15 05 2014

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