sábado, 14 de setembro de 2013

20130914 Algum passo

Algum passo


"E logo os chamou." - MARCOS,1:20


Todo dia temos desafios a vencer na relação com nossos semelhantes.


Quantas vezes fui intransigente e grosseiro? Milhares.


Quantas ainda serei? Espero que poucas.


Sei. A retomada do caminho é difícil. Adiante tenho/temos uma estrada arenosa e cheia de pedregulhos. Em verdade nada convidativa se tivermos preguiça. Mas se pusermos objetivos mais amplos em nossa vida, visando um maior desenvolvimento em nossa existência, devemos nos acostumar com a ideia do caminho árduo. E de por ele caminhar.


É como um prato de sopa muito quente. Pelando mesmo. Não dá para meter a colher, e levar à boca sem queimar a língua. Devemos ir selecionando as colheradas pelas beiradas. Onde está menos quente. É o mais sábio.


Assim ocorre para quem busque a evolução. Se a estrada é cheia de dificuldades e obstáculos, seremos obrigados a andar em um ritmo mais lento, mas mantendo firmes os passos e os objetivos.


Um espírito frouxo não cumpre meta nenhuma.


Só cumpre metas aquele que, de decisão firme, vai seguindo. Mesmo tendo fases de avanços menores, segue em seu projeto. Pois uma coisa é certa: A evolução é um caminho próprio do espírito. De sua decisão e garra.


Mas para isso é necessária uma tomada de consciência nascida de dentro para fora. Um "insight" propulsor da renovação.


Pode vir até do sofrimento, mas é muito mais interessante se vier de nossa atenção ao mundo que nos cerca. Se a experiência do outro nos servir, se apurarmos nossa sensibilidade para a espiritualidade, rompendo com a materialidade imperante ao nosso redor.


Não há modelos a seguir à medida em que o homem é senhor de sua racionalidade. Todas as contribuições podem a ele chegar.

Dono do próprio destino desenha e redesenha qual a rota a seguir: o asfalto da materialidade ou o caminho algo mais árduo da busca do Bem Maior para si e para toda a humanidade.


Estamos sim com os pés no chão, e assim devemos estar. Mas podemos ter o espírito voltado para horizontes mais amplos, sem com isso deixar de contribuir de forma efetiva com o mundo material do nosso entorno. Esse equilíbrio é meta para todos nós que temos no espiritismo um roteiro para o caminho.


A Liberdade é total, pois cada um sabe muito bem onde lhe apertam os sapatos. E caminha segundo decisões renovadas a cada dia. A cada dia algum passo.



Paulo Cesar Fernandes

14 09 2013

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

20130913 CCR

CCR


Credence Clearwater Revival na sala. No telão da memoria um filme preto e branco me trás o passado. Não há como negar que os
acordes musicais carreguem em si imagens, recentes ou remotas.


Somos brindados pelo passado a cada momento do presente; mas, por outro lado, temos a capacidade de reregistar nosso tempo e nosso momento para revisitá-lo num momento qualquer do futuro.


Numa tarde solta, num qualquer dia da semana. Afinal o tempo não é tão linear como o imaginamos. Todos somos frutos do tempo, do
tempo mental muito mais que daquele preso aos ponteiros de um relógio de estação de trem.


Navegamos no tempo. Imortalmente livres, navegamos no tempo.


Aqui e agora são apenas flashes registráveis, preferencialmente numa pauta musical; ou numa ousada trilha sonora de um tempo ou de um movimento político-existencial.


Mais que tudo somos revolucionários de nosso tempo, e de nossa maneira de concebe-lo. Pois o movimento a tudo faz eterno e a tudo
muda a cada segundo.


Assim o sinto quando as manchas de asfalto da Rua Pasteur se projetam na parede de minha sala, ou em qualquer outro recanto mágico do presente. Pois todo tempo é tempo bom se sabemos mirarlo na perspectiva da eternidade inerente a cada um de nós.


Eternos e crescentes somos todos. Inevitavelmente. E isto é muito bom.


Paulo Cesar Fernandes

13 09 2013

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

20130911 Síntese histórica

Síntese histórica


Nenhum escritor espírita tem para mim a significação de Herculano. Por mais respeito tenha pelos demais, aliar uma cultura tão ampla, um idealismo sem limites e um tal conhecimento da obra de Allan Kardec, não há quem no Brasil. Talvez nem no mundo.


Este primeiro item do seu Curso é um apanhado amplo, apesar de sintético do processo de desenvolvimento do homem até sua chegada na Era do Espírito. Me calo para que fale quem sabe dizer as coisas.
*
José Herculano Pires
Curso Dinâmico de Espiritismo: esse grande desconhecido.

*
O Processo Cultural

*

No desenvolvimento da Cultura, em nosso mundo, podemos assinalar três fases bem definidas no processo histórico:


a) Culturas Empíricas;

b) Culturas Religiosas;

c) Culturas Científicas.


As Culturas Empíricas se desenvolvem nas relações primárias do homem com a Natureza, através das experiências naturais.


Nessas experiências o homem elabora os três elementos básicos de toda a cultura:

• a linguagem.

• o rito.

• o instrumento.



Não se trata de uma elaboração sucessiva, mas sincrônica, de uma reelaboração das experiências animais. Tudo se encadeia no Universo, diz O Livro dos Espíritos.


Nesse encadeamento as vozes animais se transformam na linguagem humana, os ritos em rituais da sociabilidade humana e dos cerimoniais religiosos, as garras dos animais se projetam nos instrumentos de pau e pedra de que o homem se serve para agir sabre a Natureza e adaptá-la as suas necessidades de sobrevivência.


As experiências que desenvolvem a Cultura Empírica excitam as potencialidades do espírito, desenvolvendo-as nas tribos e nas hordas. A lei de adoração, proveniente da ideia inata de Deus no homem, gera a reverência pelos poderes misteriosos da Natureza e institui os primeiros rituais de reverência aos pagés ou xamãs e feiticeiros, bem como ao cacique e aos chefes guerreiros. O culto às divindades da selva nasce desses rituais.


A Cultura Empírica gera a Cultura Religiosa das primeiras tribos sedentárias. A idéia de Deus se define mais nítida com o desenvolvimento da Razão, sob a influência dos ritos da Natureza, nas primeiras civilizações agrárias e pastoris. O milagre das germinações, no ritmo regular das estações, e a proliferação dos rebanhos provam a existência de inteligências controladoras dos fenômenos naturais e protetoras do homem. O animismo, projeção da alma humana nas coisas, impregna a Natureza com uma vida factícia em que a pedra, a árvore, o rio, o bosque, a montanha, o mar, tudo fala e pensa em condições humanas. As manifestações espíritas provam a realidade anímica da Natureza. A figura de Deus, Ser Superior, criador e dominador do mundo, impõe-se ao homem na forma necessariamente humana. E como Deus não pode estar sozinho, multiplica-se em mitos que simbolizam as suas várias atividades, ligadas às atividades humanas. Ao mesmo tempo, as forças destruidoras e as manifestações de espíritos malignos geram os mitos da oposição a Deus. Nasce o Diabo desse contraste, estabelecendo a luta entre o Bem e o Mal, sujeitando o homem
à esperança da proteção divina e ao temor dos poderes maléficos.


A Cultura Religiosa se configura na síntese dessa dialética do invisível e do visível, do sentimento e da sensação, fazendo evoluírem as civilizações agrárias e pastoris para a fase das civilizações teocráticas que se desenvolvem no Oriente, nas regiões em que brilha a luz em cada alvorecer. Os ritmos da Terra e do Céu, do dia e da noite, as estações do ano, o Sol e a Lua, as constelações anunciadoras de cada mudança no tempo, a chuva e as inundações, os terremotos, as erupções vulcânicas, as pestes, as pragas, o relâmpago, o raio, as tempestades exigem a disciplinação do caos e ao mesmo tempo a complexidade dos cultos. Os soberanos das nações são filhos de Deus e possuem poderes divinos. A Cultura se desenvolve na argamassa dos sentimentos e das sensações. A Fé se define como sentimento e sensação em misturas condicionadas pela Razão, expressa nas formulações filosóficas. A Teologia brota desse complexo de mistérios como a Ciência Suprema dos videntes e dos profetas, dos homens mais do que homens de que falaria Descartes, homens privilegiados pela sabedoria infusa que desce do Céu para iluminar a Terra. A Cultura Religiosa é uma oferenda celeste que os homens simplesmente homens não podem tocar com suas mãos indignas, não podem avaliar com suas mentes entorpecidas pelos interesses materiais e as ambições inferiores da vida perecível. O mundo se divide em duas partes inconciliáveis: surgem os conceitos do Sagrado e do Profano. As Culturas Religiosas desligam-se da tradição empírica, rejeitam a experiência natural, relegando-a ao campo do profano, do pecaminoso. Entregam-se à alienação do suposto, do imaginário.


O Cristianismo envolve-se nas contradições humanas: cai na simonia, no comércio ambicioso de sacramentos e indulgências, pregando a renúncia ao mundo e a santidade da pobreza; proclama a humildade como virtude e investe-se do poder político; denuncia o paganismo e o judaísmo como heréticos e assimila os seus elementos rituais e a sua política gananciosa; prega o Reino de Deus e apossa-se dos reinos terrenos; impugna a sabedoria grega e constrói o seu saber com decalques de Platão e Aristóteles; ensina a fraternidade e promove guerras fratricidas em nome de Deus; erige-se em religião do Deus Único e divide Deus em três pessoas distintas; institui o celibato como virtude e faz comércio ambicioso do sacramento do matrimônio; combate a magia e reveste o seu culto de poderes mágicos; luta contra as heresias e comete a suprema heresia de submeter Deus ao poder do sacerdócio no ato eucarístico; profliga a idolatria e enche os seus templos com ídolos copiados da idolatria mitológica, chega ao máximo da alienação estabelecendo o sistema fechado das clausuras e dos mosteiros segregados; prega o Evangelho e nega ao povo o acesso aos textos que considera privativos do clero; proclama a supremacia espiritual do amor e semeia o ódio aos que não aceitam os seus princípios.


A alienação cristã faz da cultura um sincretismo de absurdos assimilados de dogmas e rituais bastardos de igrejas e ordens ocultas da mais alta Antiguidade, transformando o conhecimento em gigantesca colcha de retalhos em que as próprias vestes sacerdotais e paramentos do culto são copiados de antigas e condenadas igrejas. A cultura cristã se desenvolve com pressupostos falaciosos e um fabulário ridículo enxameado de superstições erigidas em verdades absolutas, provindas de revelações divinas. A verdade artificial da sabedoria eclesiástica encobre a realidade com o espesso véu das elucubrações dos teólogos, modelos de esquizofrenia catatônica e megalomania delirante. A cultura em evolução nas fases anteriores cai na estagnação de um charco de mentiras sagradas, pílulas doiradas de um anestésico.


Interrompe-se o processo cultural. Não se pode conhecer mais nada. Cada Igreja tem a sua verdade própria e inverificável, sendo a Igreja Cristã a mais poderosa barreira a qualquer tentativa de investigação da realidade. A morte cruel é o prêmio dos que se atreverem a rasgar o Véu de Isis para mostrar o corpo da Verdade Nua.

O desenvolvimento da imaginação criadora levara a cultura a um solipsismo devorador. Tudo estava esclarecido, a imaginação dos poetas (considerados profetas) resolvia todos os mistérios em termos de mitologia grega ou tradição romana, os teólogos solucionavam os problemas da vida e da morte com belas frases em latim, as Igrejas detinham a Verdade Absoluta, amaldiçoando-se entre si, e velavam pela ordem cultural perseguindo e matando em nome de Deus os atrevidos que tentassem profanar a Palavra de Deus, escrita na Bíblia por velhíssimos judeus que haviam, num complô com César e seu legado Pilatos, condenado à flagelação e à cruz um jovem carpinteiro que tivera audácia de se apresentar como o Messias de Israel.


A Cultura Científica teve de romper a golpes de atrevimento a selva selvaggia dessa cultura religiosa inconseqüente, contraditória e arrogante, empalhada como um pássaro morto em velhos pergaminhos de uma sabedoria feita de suposições e elucubrações pretensiosas. O mundo dos homens desligara-se totalmente da realidade, fechando-se num casulo de formulações abstratas. Mais bizantina que Bizâncio, Roma sofismava sobre problemas que se recusava a conhecer. Só a ignorância total e a ingenuidade das populações bárbaras poderia aceitar. Após a queda do Império do Ocidente, comprovava-se historicamente a afirmação evangélica de que o ensino de Jesus seria deturpado e necessitaria de tempo para que os homens pudessem compreendê-lo. O milênio medieval teria a função de desenvolver a razão como guia do pensamento e freio da imaginação, ao fogo das tragédias e loucuras de um misticismo criminoso, para que, no Renascimento, os frutos de experiências dolorosas abrissem perspectivas para o desenvolvimento de uma cultura realista, apoiada em pesquisas metódicas da realidade.


Foi então que a esquizofrenia mundial revelou-se em definitivo: o espírito humano estava dividido numa cultura fantasiosa, formada pela dogmática absurda das religiões, e numa cultura rebelde, atrevida e exigente, que arrancava os homens da ilusão de um saber confuso, para oferecer-lhes o saber legítimo que iniciara a fase das
experiências empíricas e se negara a si mesma no desenvolvimento alucinado do fanatismo religioso. O movimento da Reforma, desencadeado por Lutero, em consequência das lutas de Abelardo e das proposições de Erasmo de Roterdã, em conjugação aparentemente ocasional com as tentativas de pesquisas objetivas de Galileu, Copérnico, Giordano Bruno e outros mártires da Ciência nascente, marcavam os rumos de uma nova concepção do mundo e do homem. Abelardo foi o precursor medieval de Descartes, que por sua vez foi o precursor de Kardec. Aos fundamentos emocionais da Fé absurda e cega, os pioneiros do retorno ao real oferecíamos fundamentos da Razão esclarecida e da pesquisa científica. A Verdade ressurgia das cinzas das fogueiras criminosas e a Fé de olhos abertos substituía a ceguinha esclerótica das sacristias.


Mas a luta pela Verdade da concepção cristã restabelecida só atingiria o seu apogeu nos meados do Século XIX, com a Codificação do Espiritismo, através das pesquisas pioneiras de Kardec sobre os fenômenos mediúnicos, hoje admitidos pela Ciência com a denominação de paranormais. Kardec provara que os médiuns não eram anormais, como pretendiam os investigadores da Medicina e da Psicologia, nem sobrenaturais, como pretendiam os defensores de dogmas obsoletos, mas naturais e normais. A Mediunidade se impunha à pesquisa dos cientistas exponenciais da época, que rasgavam ao mesmo tempo o Véu do Templo, revelando os seus mistérios, os Véus de Isis, para desvendar o sentido dos símbolos mitológicos. Os homens começaram então a aprender que não sabiam nada e tinham de lutar para descobrir a Verdade escondida atrás da aparência enganosa das coisas e dos seres. A Ciência Espírita instalou-se no mundo, com as consequências necessárias da Filosofia Espírita e da Religião em Espírito e Verdade. O Espiritismo, em seus três aspectos, está hoje confirmado pela Cultura Científica e seu alcance cósmico se confirma no ritmo acelerado das conquistas culturais do século, restabelecendo o ensino deturpado pelas ambições humanas, que Jesus de Nazaré semeou em palavras de vida e imortalidade nas almas de todos os tempos.

***

Neste dia 11 de setembro, ao completar 40 anos da morte de Salvador Allende gostaria de lhe render uma homenagem, bem como a Herculano Pires. Dois espíritos voltados para o Bem de Todos e tendo a Justiça como um roteiro, uma meta.


Paulo Cesar Fernandes

11 09 2013

20130911 Eu e minhas aldeias

Eu e minhas aldeias


Via um vídeo de Mia Couto, poeta e escritor moçambicano. Em determinado momento ele se referiu a aldeia.


Muito longe do contexto da fala do poeta, uma questão pulou em meu colo: Qual é a tua aldeia?


Sim claro: família, música e filosofia/conhecimento.


Mas apenas isso?


Não estaria eu impondo limitantes ao meu processo de crescimento, na medida em que me faço ilha, e sem pontes de acesso a outras
pessoas?


Mia Couto havia falado em pontes do conhecimento.


Mas seria apenas no conhecimento a necessidade de pontes?


Meu coração não pode abrir pontes aos que fazem parte de minha aldeia? Afinal somos tão poucos. E ilhados nos fazemos mais fracos.


Deves estar te perguntando qual seria minha aldeia.


Pois te digo através de suas siglas: CEAK; LV; ARS; ICKS; CPDoc; SBPE; USE; CRE; Rádio Boa Nova; Renascer; e outras tantas cujo nome me escapa.


Não vou deixar meus músicos, meus filósofos tão queridos, mas posso de alguma maneira retomar um caminho. Uma aldeia da qual me afastei por minha intransigência e minha incapacidade de compreensão e aceitação de outras formas de pensar, sentir e agir.


É difícil fazer autocrítica, mas impossível não faze-la quando a intuição clama forte dentro de nós.


Afinal, como diz León Gieco, poeta e militante argentino, somos todos "do mesmo barro".


Paulo Cesar Fernandes

11 09 2013