sábado, 15 de novembro de 2014

20141115 Papel dos médiuns


Revista Espírita   (Julho de 1861


Papel dos médiuns nas comunicações.

(Obtidas pelo Sr. d'Ambel, médium da Sociedade.)



Qualquer que seja a natureza dos médiuns escreventes, quer sejam mecânicos, semimecânicos, ou simplesmente intuitivos, nossos 
procedimentos de comunicação com eles não variam essencialmente. Com efeito, nos comunicamos com os próprios Espíritos encarnados, como com os Espíritos propriamente ditos, unicamente pela irradiação do nosso pensamento.


Os nossos pensamentos não têm necessidade da vestimenta da palavra para serem compreendidos pelos Espíritos, e todos os 
Espíritos percebem o pensamento que desejamos lhes comunicar, unicamente pelo fato de dirigirmos esse pensamento a eles, e isso em razão de suas faculdades intelectuais; quer dizer, que tal pensamento pode ser compreendido por tais e tais, segundo o seu adiantamento, ao passo que em tais outros, esse pensamento não desperta nenhuma lembrança, nenhum conhecimento no fundo do seu coração ou do seu cérebro, não é perceptível para eles. 


Neste caso, o Espírito encarnado que nos serve de médium é mais próprio para dar nosso pensamento para outros encarnados, se bem que não o compreenda, que um Espírito desencarnado, e pouco avançado, não poderia fazê-lo, se fôssemos forçados a recorrer à sua intermediação; porque o ser terrestre coloca o seu corpo, como instrumento, à nossa disposição, o que o Espírito errante não pode fazer. 


Assim, quando encontramos num médium o cérebro equipado de conhecimentos adquiridos em sua vida atual, e o Espírito rico de 
conhecimentos anteriores latentes, próprios para facilitarem as nossas comunicações, dele nos servimos com preferência, porque com ele o fenômeno da comunicação nos é muito mais fácil, do que com um médium cuja inteligência seria limitada, e cujos conhecimentos anteriores teriam ficado insuficientes. 


Vamos nos fazer compreender por algumas explicações claras e precisas.


Comum médium cuja inteligência atual, ou anterior, se encontre desenvolvida, o nosso pensamento se comunica instantaneamente 
de Espírito a Espírito, por uma faculdade própria da essência do próprio Espírito. Nesse caso encontramos no cérebro do médium os elementos próprios para revestir o nosso pensamento da roupa da palavra que corresponde a esse pensamento, e isso, mesmo que o médium seja intuitivo, semi-mecânico ou mecânico puro. 


E porque, qualquer seja a diversidade dos Espíritos que se comunicam a um médium, os ditados obtidos por ele, mesmo procedendo de Espíritos diversos, trazem uma marca de forma e de cor pessoal a esse médium. Sim, se bem que o pensamento lhe seja inteiramente estranho, se bem que o assunto saia do quadro no qual ele mesmo se move habitualmente, se bem o que queremos dizer não provenha de nenhum modo dele, por isso não influencia menos a forma, pelas qualidades, as propriedades que são adequadas à sua individualidade.


É absolutamente como quando olhais diferentes pontos de vista com lunetas coloridas, verdes, brancas ou azuis; se bem que os pontos de vista, ou objetos olhados, sejam inteiramente opostos, e inteiramente independentes uns dos outros, isso não afeta menos, sempre, um colorido que provém da cor das lunetas. Ou melhor, comparemos os médiuns a esses vidros de boca larga, cheios de líquidos coloridos e transparentes, que se vêem na vitrina dos laboratórios farmacêuticos; pois bem! somos como luzes que clareamos certos pontos de vista morais, filosóficos e internos, através de médiuns azuis, verdes ou vermelhos, de tal sorte que os nossos raios luminosos, forçados a passarem através dos vidros, mais ou menos bem talhados, mais ou menos transparentes, quer dizer por médiuns mais ou menos inteligentes, não chegam sobre os objetos, que queremos clarear, senão carregando o colorido, ou melhor, a forma própria e particular a esses médiuns. Enfim, para terminar por uma última comparação, nós, Espíritos, somos como compositores de música que compusemos ou queremos improvisar uma música e não temos sob a mão senão um piano, senão um violino, senão uma flauta, senão um fagote ou senão um apito de dois sons.


É incontestável que, com o piano, a flauta ou o violino executaremos nosso trecho de maneira mais compreensível aos ouvintes; se bem que os sons provindos do piano, do fagote ou da clarineta, sejam essencialmente diferentes uns dos outros, nossa 
composição não será por isso menos identicamente a mesma, salvo as nuanças do som. Mas se não temos à nossa disposição senão um apito de dois sons, um funil de encanador, aí para nós jaz a dificuldade.


Com efeito, quando somos obrigados a nos servir de médiuns pouco avançados, o nosso trabalho se torna bem mais longo, bem 
mais penoso, porque somos obrigados a ter recursos de formas incompletas, o que é uma complicação para nós; porque então 
somos forçados a decompor o nosso pensamento e a proceder, palavras por palavras, letras por letras, o que é um aborrecimento e uma fatiga para nós, e um entrave real à prontidão e ao desenvolvimento das nossas manifestações.


É porque estamos felizes por encontrar médiuns bem apropriados, bem aparelhados, munidos de materiais prontos para funcionarem, bons instrumentos, em uma palavra, porque então o nosso perispírito, agindo sobre o perispírito daquele que mediunizamos, não há mais do que dar o impulso à mão que nos serve de porta-lápis; ao passo que com os médiuns insuficientes, somos obrigados a fazer um trabalho análogo àquele que fazemos quando nos comunicamos por pancadas, quer dizer, designando letra por letra, palavra por palavra, cada uma das frases que formam a tradução dos pensamentos que queremos comunicar.


É por estas razões que nos dirigimos de preferências às classes esclarecidas e instruídas, para a divulgação do Espiritismo e o desenvolvimento das faculdades mediúnicas da escrita, se bem que seja entre essas classes que se encontram os indivíduos mais incrédulos, os mais rebeldes e os mais imorais. É que, do mesmo modo que deixamos hoje aos Espíritos brincalhões e pouco avançados, o exercício das comunicações tangíveis de golpes e de transportes, do mesmo modo os homens pouco sérios entre vós preferem a visão dos fenômenos que ferem seus olhos e seus ouvidos, aos fenômenos puramente espirituais, puramente psicológicos.


Quando queremos proceder por ditados espontâneos, nós agimos sobre o cérebro, sobre os compartimentos do médium, e reunimos 
os nossos materiais com os elementos que ele nos fornece, e isso com o seu inteiro desconhecimento; é como se tomássemos em sua bolsa as somas que ali pode ter, e organizássemos as diferentes moedas segundo a ordem que nos parece mais útil.


Mas quando o próprio médium quer nos interrogar de tal ou tal modo, seria bom se nisso refletisse seriamente, a fim de nos perguntar de maneira metódica, facilitando assim nosso trabalho de resposta. Porque, como disse Erasto, em uma precedente instrução, freqüentemente, o vosso cérebro está numa desordem inextricável, e nos é bastante penoso, senão difícil, nos 
movermos na complicação dos vossos pensamentos. Quando as perguntas devem ser postas por terceiros, é bom, é útil que a série 
das perguntas seja comunicada, adiantadamente, ao médium, para que este se identifique com o Espírito do evocador, e dele se impregne por assim dizer; porque nós mesmos, então, teremos maior facilidade para responder, pela afinidade que existe entre o nosso Espírito e do médium que nos serve de intérprete.


Certamente, podemos falar de matemáticas por meio de um médium que a ele pareça inteiramente estranho; mas, freqüentemente, o Espírito desse médium possui esse conhecimento em estado latente, quer dizer, pessoal ao ser fluídico e não ao ser encarnado, porque o seu corpo atual é um instrumento rebelde, ao contrário, a esse conhecimento. Ocorre o mesmo na astronomia, na 
poesia, na medicina e nas línguas diversas, assim como em todos os outros conhecimentos particulares à espécie humana. 


Enfim, temos ainda o meio da elaboração penosa em uso com os médiuns completamente estranhos ao assunto tratado, reunindo as 
letras e as palavras como em tipografia.


Como dissemos, os Espíritos não têm necessidade de revestir o seu pensamento; percebem e comunicam o pensamento pelo único fato de que ele existe neles. Os seres corpóreos, ao contrário, não podem perceber o pensamento senão revestido. Ao passo que a letra, a palavra, o substantivo, o verbo, a frase, em uma palavra, vos são necessárias para perceber mesmo mentalmente, nenhuma forma visível ou tangível é necessária para nós.


ERASTO E TIMÓTEO,

Espíritos protetores dos médiuns.


===

A que reflexões somos levados por este texto?

A mim, veio à mente a figura de Deolindo Amorim, incitando os espíritas a um estudo constante e profundo de todas as áreas do 
conhecimento. Não bastasse o prazer do conhecimento em si mesmo, vimos que, em espíritos mais preparados não apenas 
moralmente, como intelectualmente, as comunicações mediúnicas ocorrem com muito maior facilidade para o espírito comunicante.

Sendo o espírito pensamento a comunicação acaba ocorrendo pela simples interpenetração dos dois espíritos. De tal forma se 
identificam, as imagens do pensar do comunicante se deslocam de forma natural para o médium, cabendo a este a transcrição das
ideias, em sua linguagem e formas de expressão.

Achei muito rica a contribuição desses dois companheiros espirituais no tocante ao processo mediúnico.

Devemos ser gratos a eles e a Kardec por sua inclusão na Revista Espírita.



Paulo Cesar Fernandes

15/11/2014