sábado, 3 de janeiro de 2015

20150102 O Tempo e o Ser

O Tempo e o Ser



O tempo? Ele é o universo do Ser.
Nele se espraia o Ser na aquisição de multiplas possibilidades vivenciais.


Cada uma das vivências propositora de desafios a ser vencidos: perdas; desafetos; solidão; falsidade; competividade; traições; e tantos outros.


Mas quando este mesmo Ser, arrojado nas várias vivências, toma consciência de si, e dos possíveis rumos do seu existir, tudo muda de figura.


Não mais um ser rolando nos descaminhos das ilusões. Sabe o custo de sua Tomada de Consciência, e das posturas a brotar a
cada novo instante. Firma estacas nessa nova visão de si e do mundo; e mais forte, do seu estar no mundo.


Como se dará esse seu "estar no mundo"?


Quais projetos acalentará?


Como enfrentará os velhos desafios nessa nova fase?



Já não é o mesmo, bem o sabe. E não ser o mesmo lhe provoca perdas.


Estará preparado?


Tem de estar. Pois a Tomada de Consciência de Si é o ponto final de um longo processo de maturação individual. Muitas etapas
se passaram para ali chegar.


Etapas são um elenco interminável de Ritos de Passagem.


Nos Povos Originários é natural a demarcação da etapa infantil para a adulta através dos chamados ritos de passagem. Em
alguns grupos tem apenas um caráter comemorativo; enquanto em outros o aspirante se submete a uma série de provas para adentrar o universo adulto.


Nosso processo de maturação, de alguma forma assim é. Somos confrontados constantemente e vencemos ou somos vencidos pelos
desafios. Podemos tomar cada um desses desafios como um rito de passagem. Mas, diferentemente dos povos acima citados, não há
apenas um rito de passagem, são inúmeros ocorrendo em cada momento, e em cada etapa de nossa trajetória.


No geral, encaramos cada momento, cada uma dessas etapas como algo a ser vivido e nada mais. Não lhes damos importância.


Nunca nos postamos na popsição de observador ao se tratar de nossa vida. Vivemos e isto nos basta.


Tudo muda quando nos vemos como Ser-em-si e Ser-para-si. Esse é o momento da Tomada de Consciência. Nos sabemos Seres, e mais importante, sabemos usar em nosso favor cada momento da etapa vivencial na qual estamos mergulhados.


Estar voltado para si nada tem com egoísmo. O Ser-para-si ve o seu semelhante como um outro Ser-em-si e Ser-para-si, tal como
ele o é. Esse é o patamar da verdadeira equidade entre os seres. Tendo como desdobramento o respeito mútuo.


Não tenho esta reflexão como palavra final sobre a questão. Mesmo porque não há palavra final sobre nada. Não é possível
haver verdade. Não é possível qualquer ortodoxia. Basta olhar a História da Humanidade.


Tomemos apenas como um elemento de reflexão. Longe de mim a tentativa de impor algo a quem quer que seja.

Acima de tudo luto pela Liberdade do Ser e contra toda forma de opressão. Onde impera o autoritarismo me afasto.

Acredito que apenas um Ser Livre é capaz de se tornar Criativamente feliz.



Paulo Cesar Fernandes

02 de janeiro de 2015




P.S.:

Propositalmente inverti o título do imortal livro do Mestre Martin Heidegger "Ser e Tempo", focando sim a trajetória do Ser. Um Ser mergulhado no Tempo.

Mas nunca esquecendo o que disse o poeta Cazuza: "O Tempo não para..." e não para para ninguém em nenhuma das dimensões dos universos diversos aos quais ainda poderemos conhecer.

Será tudo uma questão de progresso. Não apenas da ciência; mas, muito mais importante, da mentalidade do homem diante dos fenômenos das Leis Naturais.



Adição após leitura em 04/01/2015

Uma posição de Carl Gustav JUNG 

Carl Gustav Jung
A energia psíquica

[111] As organizações ou sistemas são símbolos (sØmbolon = profissão de fé) que capacitam o homem a estabelecer uma posição espiritual que se contrapõe à natureza instintiva original, uma atitude cultural em face da mera instintividade.



Esta tem sido a função de todas as religiões. Por longo tempo e para a grande maioria dos homens basta o símbolo de uma religião coletiva. Talvez só temporariamente e para um número relativamente pequeno de pessoas é que as religiões coletivas existentes se tornaram inadequadas.


Onde quer que o processo cultural esteja em andamento, seja nos indivíduos, isoladamente, seja em grupos, dão-se rupturas com relação às crenças coletivas. Qualquer avanço cultural é, psicologicamente, uma ampliação da consciência, uma tomada de consciência, que só pode se realizar mediante uma diferenciação.



Por isso. Qualquer avanço começa sempre com a individuação, isto é, começa como indivíduo abrindo novo caminho através de terreno até então não desbravado, depois de haver-se conscientizado de sua própria individualização. Para chegar a isto, deve ele primeiramente retornar aos fatos fundamentais de seu próprio ser, independentemente de qualquer autoridade ou tradição, e tomar consciência de sua diferenciação.



Se conseguir conferir um valor à sua consciência ampliada, ele provocará uma tensão entre os opostos que lhe fornece estímulos para seus progressos posteriores.



[112] Com isto não queremos dizer que o desenvolvimento da individualidade seja necessário, ou pelo menos oportuno, em quaisquer circunstâncias, embora alguém possa acreditar que, segundo a afirmação de que a "maior felicidade dos filhos deste mundo é unicamente a realização da personalidade", existe um número mais ou menos grande de pessoas para as quais o desenvolvimento da individualidade é uma exigência primordial, especialmente em uma época cultural como a nossa, que se
banalizou por uma mentalidade coletiva e onde são praticamente os meios de comunicação que dominam o mundo.




Segundo minha experiência, naturalmente limitada, existe, entre as pessoas de idade madura, um número considerável daquelas para as quais o desenvolvimento da personalidade é um requisito essencial.


Por isso sou privadamente da opinião - exclusivamente pessoal - de que são justamente as pessoas em idade madura as que mais necessidade têm de um pouco mais de educação no plano da cultura individual, depois que sua educação juvenil, na escola ou na universidade, as formou numa linha exclusivamente coletiva, impregnando-as literalmente de uma mentalidade coletiva.


Sei bastante, por experiência, que as pessoas nessa idade são, sob este aspecto, muito mais capazes de educação do que propriamente se espera, embora sejam justamente os indivíduos amadurecidos e fortalecidos pela experiência da vida os que mais vigorosamente resistem a um ponto de vista meramente redutivo.



[113] É naturalmente no período da juventude em que mais podemos lucrar de um reconhecimento amplo da nossa instintividade.


Assim, por ex., o reconhecimento da sexualidade, cuja supressão neurótica afasta indevidamente o indivíduo da vida ou o obriga, desventuradamente, a um modo totalmente inadequado de viver, com o qual ele necessariamente entra em conflito.


Um reconhecimento e uma apreciação justa dos instintos normais conduzem o jovem à vida e o envolvem em acontecimentos que o levam, por sua vez, a novas necessidades da vida e aos conseqüentes sacrifícios e esforços mediante os quais seu caráter se robustece e suas experiências maturam.



Para a pessoa madura, na segunda metade da vida, entretanto, a continuada expansão da vida já não é, evidentemente, o princípio correto, porque a descida no entardecer da vida exige simplificação, limitação e interiorização; em outras palavras: exige cultura individual.



A pessoa, na primeira metade da vida, com sua orientação biológica, geralmente pode, graças à juventude de seu organismo, expandir, sem dificuldade, a sua vida e dela fazer alguma coisa de valor. Mas o homem na segunda metade da vida está, naturalmente, orientado para a cultura, enquanto as forças decrescentes de seu organismo permitem-lhe subordinar seus instintos aos pontos de vista culturais.



Não poucos naufragam na passagem da esfera biológica para a esfera cultural. Nossa educação marcadamente coletiva não
faz praticamente provisões para este período de transição.



Enquanto nos voltamos exclusivamente para a educação dos jovens, descuidamos da educação do adulto, a respeito do qual se admite - não se sabe com qual fundamento - que não tem necessidade de educação. Falta-lhe, por assim dizer, toda e qualquer guia para esta passagem, extraordinariamente importante, da atitude biológica para a atitude cultural, para a transformação da energia da forma biológica na forma cultural.



Este processo de transformação é de natureza individual e não pode ser imposto por regras e prescrições gerais. A transformação da libido se opera através do símbolo. A formação dos símbolos é um problema fundamental que não cabe discutir no âmbito deste trabalho. Devo remeter o leitor ao capítulo V do meu livro Tipos Psicológicos, onde tratei detalhadamente esta questão.


C. G. Jung

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