José Herculano Pires
O espírito e o tempo
Capítulo 3
Horizonte civilizado: mediunismo oracular
Nos Estados Teológicos,
a estrutura política assemelha-se à estrutura metafísica ou divina. A Religião
e o Estado se modelam reciprocamente, uma sobre o outro, e vice-versa. A classe
sacerdotal, racionalmente organizada, elabora os mitos no plano intelectual,
criando a teologia, estruturando o ritualismo, estabelecendo a genealogia dos
deuses e as formas de relações entre estes e os homens.
A teogamia egípcia, de
que já tratamos, é um dos mais perfeitos exemplos dessas formas de relações: a
genealogia divina se prolonga na genealogia humana dos faraós, graças à
fecundação da rainha por um deus. Amalgamados assim os dois poderes, o temporal
e o divino, na própria carne dos monarcas, os Estados Teológicos tornam-se
monolíticos.
Ainda na Grécia vemos
isso: a figura humana de Zeus, na sua corte olímpica, refletindo no espaço a
estrutura política da nação.
Murphy acentua esse
aspecto do horizonte civilizado, da seguinte maneira:
“No horizonte que
chamamos civilizado, a religião reflete o sistema político e social: é em geral
politeísta, com um grupo de deuses semelhante ao Senado de uma República ou,
mais frequentemente, à corte de um monarca supremo e mais ou menos autocrata.
Os deuses são principalmente as forças da natureza, como anteriormente, sob o horizonte
agrícola, mas, agora, mais profundamente personalizadas e dotadas de uma
realidade dramática, que resulta do progresso da reflexão mental, entre as
classes que dispuseram de lazer nessas antigas nações civilizadas.”
Os Espíritos presentes
nesse horizonte — devemos acentuar, por nossa vez — são ainda os da tribo e os
do horizonte agrícola, mas enriquecidos pela experiência e pelo desenvolvimento
do pensamento abstrato.
Um novo Espírito,
entretanto, marcará esse horizonte. Murphy considera o seu aparecimento, e com
razão, como “acontecimento de imensa importância”.
Trata-se do “Espírito
Civilizado”, como o chama Murphy, ou o que poderíamos chamar Espírito de
Civilização. Esse Espírito se caracteriza por três funções especiais:
a capacidade de
formulação de conceitos abstratos, de formulação de juízos éticos e morais, e
de formulação de princípios jurídicos. Dessas funções surgirá o indivíduo, como
a mais bela afirmação do horizonte civilizado.
ATENTAR
PARA O TEXTO A SEGUIR:
Como vemos, o homem se liberta de si mesmo, da sua condição humana, construída
penosamente através das estruturas sociais do horizonte tribal e do horizonte
agrícola, procurando uma forma mais precisa de definição de sua natureza. Na
organização tribal, ele se libertou da condição animal e do jugo absoluto das
forças da natureza, para elaborar a sua condição própria. Na organização
agrícola, ele aprendeu a dominar a natureza e submetê-la ao seu serviço, mas
caiu prisioneiro da estrutura social. No horizonte civilizado, ele começa a
romper os liames da organização social, para descobrir-se a si mesmo, o que só
fará quando se tornar um indivíduo.
A evolução do Espírito está bem clara nesse imenso processo de desenvolvimento
histórico da humanidade. O homem se eleva progressivamente da selva à
civilização, através de períodos históricos que podem ser definidos como “horizontes”,
ou seja, como universos próprios, nos quais os diferentes poderes da espécie
vão sendo treinados em conjunto, até que o desenvolvimento da razão favoreça o
processo de individualização.
Primeiramente, o homem se destaca da natureza através do conjunto
tribal; depois, reafirma a sua independência através dos conjuntos mais amplos
das civilizações agrárias; e, depois, ainda, constrói os conjuntos mais
complexos das grandes civilizações orientais. Nestes conjuntos, porém, o homem descobre
a possibilidade de destacar-se individualmente da estrutura social. O espírito
humano se afirma como individualidade, como entidade autônoma, capaz de superar
não somente a natureza, mas a própria humanidade.
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Temos aqui, nas palavras do Professor uma explicação e um traveling histórico da formação da individualidade, tão forte e tão valorizada nos nossos tempos.
Nunca, como nestes tempos líquidos a individualidade, a subjetividade foi tão falada e tão valorizada.
Uma subjetividade que, nascida com Descartes, adquire hoje o status e o valor a ela inerentes. Recebendo, inclusive uma ressignificação histórica, na medida em que a liberdade no seu mais profundo sentido se atou, aderiu, colou à essa mesma subjetividade.
Não se pode hoje, pelo menos no Ocidente, falar em subjetividade, sujeito, indivíduo, sem que, ao mesmo tempo nos venha a noção de Liberdade.
A derrocada de todas as instituições e de todas as institucionalidades vem exatamente da não compreensão desse novo momento histórico.
Não adianta. A Igreja, os Templos, os Centros Espíritas, Templos Budistas, etc. tudo isso tende a minguar no número de pessoas presentes.
Toda tentativa dessas instituições em ampliar o número de adeptos acabará caindo no ridículo. Será a demonstração cabal da não compreensão do mundo na qual estão inseridas tais instituições.
Qual nossa tarefa enquanto espíritas? - Você deve estar se perguntando.
Divulgar a "Imortalidade do Espírito" para o conceito mais e mais fazer parte do senso comum. Possa impregnar o sentimento das massas. E quando digo massas me refiro a massas mesmo. No sentido sociológico ou marxista do termo.
Uma vez atingido esse estágio. Por lógica dedução as pessoas chegarão à Reencarnação, e ao inevitável processo da Evolução.
É o que basta. Isto posto, as decorrências éticas serão um desdobramento natural de tudo isso.
Será assim?
Não tenho como predizer ou definir que assim o seja.
Mas essa é minha atual perspectiva, a partir de todas as leituras espíritas e não espíritas feitas nos últimos cinco anos principalmente.
Não quero que concordem comigo, até prefiro a discordância sincera. Que esta me chegue através do espaço de Observações presente neste Blog.
Seu tempo na leitura deste texto é uma honra para mim. Obrigado.
Paulo Cesar Fernandes
11 11 2013