sábado, 16 de novembro de 2013

19960916 A admiração e o amor

A admiração e o amor.

 

Já de algum tempo venho me perguntando se o amor, a afeição não é determinada, em grande parte, ou na totalidade pela admiração que uma pessoa nutre pela outra.

 
Me reportando ao Aurélio, que nos clareia dúvidas, busquei a palavra admiração. Dentre outras definições encontrei : extasiar-se diante de, experimentar sentimento de admiração em relação a.

 
Vimos assim, que a admiração se insere na categoria dos sentimentos. E, a meu juízo, pela observação de diversos casamentos e uniões, quando este sentimento de admiração se rompe, a própria relação corre grande perigo, ou se esvai por completo.

 
Se o amor tem em si o elemento da posse, que determina a decisão de duas pessoas viverem juntas. É a admiração que mantém a união, pela  sua eterna possibilidade de trazer o novo.

 
Quando o encanto da admiração é quebrado, mesmo que o casal busque novas atividades no dia a dia, como passeios, viagens, tais atividades perdem seu sabor, pois o sentimento, e aí digo mais, os diversos sentimentos que compunham a relação, que sustentavam a união, mantendo o desejo de ter o outro e com ele conviver; todos estes sentimentos acabam se esvaziando. Se não forem todos, pelo menos uma parte significativa deles se esvai.

 
Daí a necessidade, de cada um dos componentes da condução do lar, buscar cada dia mais se fazer admirável, digno de admiração. E isto não deverá se dar por bravatas, ou com exotismos de qualquer espécie, tal como querer ser ginasta após certa idade, ou tantas outras atitudes ridículas adotadas como forma de se destacar no núcleo familiar.
 

Não. Quando digo fazer-se admirável, significa viver em consonância com os princípios positivos que sempre teve, agregando a esses princípios a força de projetos de crescimento, seja crescimento moral ou intelectual.
  

Quando os dois componentes responsáveis pela condução do lar adotam tal postura, cresce cada um deles, cresce e se fortalece a familia enquanto instituição, e por fim cresce a sociedade como um todo.

 

Paulo Cesar Fernandes
16/09/1996

19960608 Cultura universal


                            Cultura Universal

 

            Certa noite, Dalmo Dallari, um jurista de projeção nacional foi convidado a participar das comemorações dos 50 anos do Centro Espírita Allan Kardec. Coube a mim a tarefa de conduzi-lo de São Paulo a Santos.

            No transcurso da viagem percebi a amplitude de sua cultura, e previ o acerto da idéia de sua participação naquela atividade.

            Os pensamentos de respeito a um espírito que reúna cultura e vivência ganhavam força em mim quando um amigo emite a seguinte opinião acerca da cultura :

            “Estou certo que uma cultura humanista mais ampla é um dos aspectos do crescimento espiritual.”

            Foi a síntese do que vinha pensando até o momento.

            De imediato relacionei com outras tantas pessoas que tinhamos tido a possibilidade de convidar para participar de atividades no Allan Kardec, já nos tempos da Mocidade Espírita Estudantes da Verdade. Pessoas estas que puderam, com seu caldal cultural e seu humanismo, contribuir em muito para os componentes da casa. Entre tantos, eu citaria Waldir Cauvilla um professor de história, o deputado José Genoino falando em sua não crença na imortalidade.

            Um aspecto importante a considerar é a afinidade entre pessoas e grupos que buscam nas trilhas do conhecimento suas metas de crescimento. Tais metas transcendem, muitas vezes os limites de estreitas concepções e rotulagens como católicos, espíritas, para se espraiar no prazer da descoberta compartilhada e recíproca.

            Todas as afirmações acima se inserem na necessidade de cada um de nós, eu, bem como o leitor deste artigo, buscarmos uma forma de conhecimento mais amplo da cultura universal, conhecimento este que, sem sombra de dúvidas, trará grande impacto na nossa capacidade de compreender o Espiritismo. Seja entendendo seus princípios, seja contextualizando a obra de Kardec, percebendo a forte relação entre as idéias de Kardec e o ambiente cultural de seu tempo.

            Todas as formas de conhecimento são válidas, porém a filosofia se coloca como a área que mais contribue para ampliar nossas possibilidades de compreensão do Espiritismo. A filosofia espírita se insere em um momento histórico definido, fruto do desenvolvimento do pensamento filosófico ocorrido até aquela data.

            Cabe a cada um de nós, agora, conhecer mais, buscar aprender mais, tanto da cultura geral da humanidade, bem como do patrimônio cultural espírita, uma vez que tudo isso, contribue largamente em nosso processo evolutivo.

 

                                                                       Paulo Cesar Fernandes

08/06/1996

terça-feira, 12 de novembro de 2013

20131112 Abstração como Espiritualidade

Abstração como Espiritualidade


Esta é uma questão já de algum tempo clara para mim. A espiritualidade nada tem a ver com religiões, ou com espiritismo.


Toda atividade que nos permita abstrair da materialidade para a qual nossa sociedade nos empurra é do âmbito da
espiritualidade. Inclusive as ciências exatas. A arte e tantas outras.


Um trecho do livro de Herculano Pires vem ao encontro de minhas proposições, para minha alegria:




Temos primeiramente a capacidade de formulação de conceitos abstratos, que é o resultado de uma longa evolução da “rés cogitans”, da coisa pensante cartesiana. A História da Matemática nos ajuda a compreender esse processo, mostrando-nos o desenvolvimento da capacidade de contar, na vida primitiva.

O pensamento do homem selvagem revela a sua natureza concreta na incapacidade para contar além do número dos dedos das mãos ou dos pés, nas tribos mais atrasadas. Somente nas tribos mais evoluídas o homem se torna capaz de utilizar-se de números abstratos.


A abstração mental é, portanto, uma conquista da evolução. E a História da Filosofia nos mostra que, apesar do enorme desenvolvimento intelectual dos gregos, foi Sócrates quem descobriu o conceito e revelou a sua importância. Depois de haver conquistado o conceito, ou seja, a capacidade de conceituar, de formular a concepção dos objetos materiais, o homem se torna capaz de ajuizar, de comparar, medir e julgar as coisas.


Somente nesse momento ele se torna apto a formular juízos éticos e morais, a elaborar regras para a sua conduta moral e a esboçar um panorama ético das relações humanas e divinas. É evidente que uma função não decorre imediatamente da outra. A capacidade de abstração evolui lentamente para a de julgamento das coisas, e só numa fase adiantada da evolução intelectual atinge a de formulação de juízos éticos e morais. É o que nos mostra, por exemplo, a evolução do pensamento grego, ao passar dos antigos fisiólogos para os sofistas, e destes para os filósofos da linha socrática.

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Evidentemente, há necessidade de uma visão abrangente da obra do Professor, o que não invalida o uso desse pequeno trecho em apoio à tese por mim defendida.


Quando nosso tempo estiver, em sua grande parte, ocupado pela espiritualidade por mim proposta, não nos tornaremos
místicos, religiosos, nem algum tipo de ET. Apenas teremos escolhido, no universo de possibilidades, as atividades que
melhor se coadunem com o projeto de vida pretendido.


Leremos de todas as coisas; desenharemos; pintaremos (o sete, o oito e muito mais...); tomaremos disciplinas várias para nossa diversão; desbravaremos o universo de novas culturas, através do aprendizado de novas línguas, pelo simples prazer do conhecimento, sem uma utilidade financeira próxima ou remota; enfim, estaremos mais abertos a tudo de novo ofertado no âmbito do conhecimento.


Afinal o espirito foi criado para alçar grandes voos. Vislumbrar paisagens intrigantes e renovadoras.


Ciscar no chão da materialidade jamais nos trará a Felicidade tão sonhada por todo o que pensa existencialmente.


A nossa vida inicia no berço e termina no túmulo.


A nossa existência, por outro lado, iniciou em nossa criação e tem pela frente o infinito.


Paulo Cesar Fernandes

12  11  2013

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

20131111 FEESP Paulo Alves Godoy PENSE

FEESP Paulo Alves Godoy PENSE


Seguia eu pela Rua Maria Paula em 1975. Fazia eu meu caminho para o trabalho na IBM do Brasil, situada na Rua Araújo naquela época.


Na banca de jornais, bem em frente da FEESP (Federação Espírita do Estado de São Paulo) uma publicação me chama. Seu título "Mensagem". Haviam dois números na banca e os comprei de imediato. Tinham a grife do Professor Herculano Pires.


Através desse veículo ele desautorizava Paulo Alves Godoy de todas  as alterações feitas na Edição FEESP de "O Evangelho segundo o Espiritismo". Uma tradução melíflua e traidora dos textos de Kardec na realidade.


Contra esses termos "abrandados" se  indignou Herculano Pires.

Quando Kardec em seu texto escreve "espíritos maus" assim deve ser lido. "Espíritos menos bons" não tem o mesmo efeito e é verdadeiramente ridículo.


Isto fez o Senhor Paulo Alvez Godoy em sua tradução.


Descaracterizou o texto de Allan Kardec.


A tradução de Júlio de Abreu Filho, fiel que era, foi deixada de lado pela FEESP com que objetivo não me cabe analisar. Quero louvar a coragem do Professor em sair em defesa do correto, num tempo em que em nome de uma falsa fraternidade tudo podia e tudo passava.


Transcrevo do PENSE um dos textos desse Jornal "Mensagem" cujo nascimento e morte se deu apenas para não deixar passar em brancas núvens tal adulteração aos originais de Kardec.


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•  Somos os Construtores do Mundo
Escreve: José Herculano Pires
Em: Novembro de 2012


O final deste importante artigo, o intertítulo “Uma Tomada de Consciência”, tem sido divulgado erroneamente sob o título deste ensaio, que abrange diversas outras questões, não necessariamente as restritas ao movimento espírita. Inspirados neste artigo, vários eventos espíritas foram organizados, debates e confraternizações de
jovens espíritas.


Devido à sua profundidade e importância histórica, o PENSE publica na íntegra este que é um dos mais inflamados e apaixonados textos do mestre Herculano Pires (1914-1979), jornalista e escritor espírita, um dos maiores pensadores espíritas do século 20.


Publicado no periódico “Mensagem”, do qual era editor, em setembro de 1975, o texto foi redigido em meio a conflitos entre o ‘Guarda Noturno do Espiritismo’ e a Federação Espírita do Estado de São Paulo (Feesp), devido a uma tradução adulterada de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, feita pela Feesp e que foi denunciada por Herculano, com apoio declarado do médium mineiro Chico Xavier.


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Os profetas da tragédia falam em cataclismos geológicos, guerra nuclear, guerra bacteriológica, pestes, epidemias arrasadoras para este último quartel do século 20. Aves agoureiras anunciam a fome mundial pelo aumento da população terrena, o desaparecimento da atmosfera planetária por efeito de explosões atômicas, da devastação das matas, da poluição ambiental. Estaríamos numa fase de contradições insanáveis. O progresso acelerado nos levaria fatalmente à desgraça total, ao cumprimento das profecias apocalíticas, ao fim do mundo.


Apesar deles e dos alarmistas que propagam as suas ideias mortíferas, dos terroristas do boato, há homens sensatos, cientistas ponderados, futurólogos que não se engajam no jogo dos trustes do medo. Estes procuram mostrar, através de dados concretos e raciocínios objetivos, que as crises atuais que enfrentamos são sintomas de desenvolvimento, comuns a todos os processos de crescimento. Outros, como Isaac Asimov, fazendo concessões às mentes delirantes, sugerem soluções curiosas de ficção científica: a colonização da Lua e de Marte, a construção de cidades submarinas e cidades espaciais, o controle maciço da natalidade, a aplicação de métodos químicos para a redução do tamanho do homem e assim por diante. Milhões de criaturas humanas poderiam viver em cidades metálicas, construídas em funis gigantescos localizados em zonas intermediárias da gravitação terrena e da gravitação lunar.


Não há dúvida que estamos numa era apocalítica, semelhante a que houve na Palestina na antevéspera do advento do Cristianismo, quando as profecias da destruição constituíam o alimento preferido do sadismo coletivo. Foi precisamente dessas profecias que resultou o Apocalipse evangélico atribuído ao apóstolo João, que o teria recebido do próprio Cristo na ilha de Patmos. Essa visão judaica do fim do mundo foi considerada por Renan, Harnak, Guignebert e outros investigadores conscienciosos como um livro apócrifo, referente à queda do Império Romano, e por mero equívoco anexado às páginas do Evangelho. Mas quem poderia convencer disso os piedosos adeptos das religiões do terror, cuja fé nas desgraças vindouras é hoje alentada e alimentada pelas novas previsões de catástrofes?



O HOMEM É O PERIGO


Essas visões remotas de um tempo há muito superado são hoje exploradas pelos grupos interessados em manter o mundo nas garras. Há perigo, sem dúvida, numa fase de transição como a em que nos encontramos. Mas o perigo não vem do céu, da ira de Deus, da instalação do Tribunal do Messias entre as nuvens, com anjos tocando trombetas assustadoras nos pontos cardiais da Terra e os mortos ressuscitando sob nevoeiros atômicos, com seus corpos mortais reconstituídos pela vingança divina.


Essas apreensões ilógicas e ridículas, muitas vezes pregadas do púlpito das igrejas cristãs, de tribunas espíritas e até mesmo de cátedras universitárias, devolvem-nos à era das civilizações primitivas, agrárias e pastoris, e aos terrores do mundo mitológico ou dos sermonários medievais. O perigo existe e esse perigo é o homem, somos nós mesmos. Uma guerra nuclear não seria desencadeada pelos astros ou pela ira de Deus, mas pelos homens responsáveis pelo equilíbrio do mundo social, do mundo humano.


O mundo natural, constituído pela Natureza, sofreria as consequências da loucura humana, mas poderia recuperar, através de suas leis de equilíbrio e conservação, as zonas devastadas.


A ideia de que o homem pode destruir o mundo provém de dois elementos de con-cepções antiquadas, hoje inaceitáveis:

1.) O orgulho humano, que pretende sobrepor a fragilidade da criatura à onipotência do Criador;

2.) A crença ingênua nos poderes mágicos, segundo a qual os mágicos podiam destruir as coisas, os seres e o próprio mundo com simples sinais cabalísticos.


O aumento do conhecimento científico provoca vertigens em cérebros pouco estáveis, pouco seguros, e a vaidade natural da espécie faz certos homens pensarem que descobriram a chave da Natureza e podem manipulá-la com seus novos instrumentos técnicos, que lhes dão um acréscimo enorme de poder. Por outro lado, o pensamento mágico, sempre necessariamente contraditório, aceita a existência do Gênio Maligno de Descartes (simples hipótese de pesquisa) e transforma Deus numa espécie de Frankenstein, um ser dotado de dupla personalidade, capaz de amar e odiar ao mesmo tempo.


Mas se compreendermos, para começar, que Deus não é uma personalidade humana, mas um centro cósmico de inteligência e poder, que mantém não apenas o equilíbrio da Natureza, da Terra e do Sistema Solar, mas de todo o Cosmos, com sua infinidade de galáxias, em que milhões e milhões de mundos existem, então será fácil entendermos a falácia e o delírio dessas profecias terroristas.


A Terra é um grão de areia no infinito, de maneira que o temporal desencadeado nela pelo homem seria bem menos do que uma tempestade num copo d’água.



UMA VISÃO REAL


Os estudiosos, os pesquisadores, os cientistas honestos advertem-nos contra os abusos do poder humano, que podem causar muitos males desequilibrando o meio ambiente. Mas reconhecem, como vimos ainda recentemente no Congresso Internacional de Belgrado sobre a questão populacional, que a situação desastrosa do planeta
refere-se a determinadas zonas superpovoadas, como os grandes centros urbanos, as nações altamente industrializadas, e não a toda a Terra. Enquanto, por exemplo, as megalópoles crescem envenenadas pelos seus próprios excessos industriais, as vastas zonas campestres se despovoam. A Terra tem capacidade para uma população muitas vezes maior do que a atual e do que a prevista pelos futurólogos para os próximos anos. A falta de alimentos não decorre da falta de produtividade, mas da falta de transportes e distribuição equitativa do alimento produzido. Além disso, há o problema evidente da falta de distribuição dos recursos financeiros, da falta de revisão da estrutura econômica mundial, sujeita cada vez mais a colapsos provenientes de suas deficiências, de seus clamorosos desequilíbrios.


Cabe ao homem reestruturar os seus esquemas sociais, reajustando-os à necessidade de harmonia e equilíbrio da vida planetária. Cabe ao homem encarar esses problemas por um prisma humanístico, em que prevaleça o princípio do respeito à criatura humana, acima da defesa de princípios sociais e econômicos que estabeleceram regimes de privilégios desumanos em todo o mundo, ainda vigentes, sustentados e estimulados tanto na chamada área socialista, quanto na área do capitalismo ou neocapitalismo, tanto nos países desenvolvidos, quanto nos subdesenvolvidos ou em processo de desenvolvimento.


Delegar a entidades divinas o que nos compete ou querer investir contra as divin-dades, como novos Prometeus que pretendam roubar o fogo do céu, é simples manobra de fuga ao cumprimento de nossas responsabilidades imediatas. Os princípios evangélicos, a evolução do Direito, a Carta dos Direitos Humanos, o avanço do pensamento filosófico, o desenvolvimento científico e tecnológico, o amadurecimento da razão, todos esses fatores e muitos outros abrem perspectivas novas para a solução dos nossos problemas sociais, culturais e econômicos. Mas, os interesses constituídos e a cegueira da maioria das criaturas (ou a miopia coletiva) impedem a ação eficaz para essa solução. Não precisamos de cidades em funis metálicos no espaço sideral. Aqui mesmo, na Terra, há lugares de sobra para a multiplicação inevitável de nossos centros urbanos. O neomaltusanismo dos nossos dias é ainda mais desarrazoado que o de Malthus. Nossas possibilidades de produção de alimentos cresceram em progressão geométrica, graças ao desenvolvimento científico e tecnológico. O que nos falta é o controle, a ordenação precisa e rigorosa dessas possibilidades, para que os perigos humanos que nos ameaçam sejam superados.



ADMINISTRAÇÃO TERRENA


Dos seus voos heroicos, hoje insignificantes ante o progresso espantoso dos voos aeronáuticos e astronáuticos, Saint-Exupéry chegou à conclusão que deu título ao seu livro famoso: “Terra dos Homens”. Tinha razão o poeta-voador. A Terra é nossa. Foi o ninho em que nascemos e nos desenvolvemos. Mas ainda não aprendemos a administrá-la. A reduzida população terrena dos milênios transcorridos, confinada em zonas determinadas do planeta, com suas civilizações ilhadas, legou-nos a experiência das administrações locais, reduzidas a técnicas dispersivas, desligadas da visão universal que o Cristianismo nos traria. Aprendemos a administrar pequenas nações, mesmo quando situadas em grandes territórios, e a lei da inércia, dominante na estática social e anquilosada nas tradições regionais, consagrou princípios
inadequados, impondo-os ao mundo mais vasto e rico do futuro (hoje convertido em presente) como se tivessem validade universal e eterna. Percebemos isso, sentimos o desajuste, mas os interesses criados e a ambição estimulada continuam a agir como meios de contenção do processo renovador.


A evolução cultural deu-nos a possibilidade de compreender Deus em plano superior, mas as nossas deficiências de formação impedem essa compreensão e ainda nos amarram a condicionamentos embaraçosos. Não somos capazes de entender a senha lírica de Saint-Exupéry e transformar o planeta na Terra dos Homens. Não compreendemos sequer a responsabilidade de organização e administração planetária, que decorre de nosso próprio livre-arbítrio, de nossa própria liberdade. Apelamos
para esquemas rígidos e desumanos, baseados em processos de violência e opressão, esquecidos do princípio fundamental da fraternidade humana. Falamos em igualdade de direitos, em distribuição da riqueza, em oportunidades para todos, e continuamos a agir como barões feudais, sem forças para rejeitar os sistemas de escravidão e servidão que nos vêm do passado remoto.


Diante do sentimento de impotência gerado por essa situação e pelas dolorosas experiências recentes de soluções arbitrárias, impostas pela força, com o esmagamento das liberdades humanas, com o desrespeito à dignidade da criatura humana, apelamos para a descrença nos valores do espírito e mergulhamos no caos das concepções materialistas e pragmatistas.


Não é Deus, nem quaisquer outras divindades, que nos ameaçam com flagelos destruidores. Somos nós mesmos, os homens, os produtores de flagelos, os criadores de cataclismos.



DESENVOLVIMENTO DA INTELIGÊNCIA


Desenvolvemos a inteligência de maneira assombrosa.


Reclamamos a falta de gênios, em comparação com as idades de ouro do passado, e não percebemos que temos mais ouro do que nunca e por isso mesmo os gênios não alcançam o destaque e a fama de outras eras. Aludimos ao inconsciente coletivo e não vemos o arejamento da consciência coletiva, o crescimento da inteligência no povo, nas massas.


Costuma-se atribuir à influência dos novos meios de comunicação a precocidade mental das crianças de hoje, esquecendo-se que a evolução natural da inteligência determinou o aprimoramento e a expansão dos meios de comunicação. As novas gerações manifestam-se inquietas, criando problemas, suscitando crises morais, políticas e sociais. Como afirma Ingenieros: “A juventude toca a rebate em toda renovação”. Dewey acentuou a importância da reelaboração das experiências pelas novas gerações. Cada jovem é um projeto de realizações renovadoras, em maior ou menor medida, e não temos o direito de frustrá-los com o nosso temor do futuro. Eles, os jovens, são o futuro e temos de ajudá-los na realização de suas aspirações, integrando-os nas experiências atuais e preparando-os para o amanhã.


A posição conservadora das velhas gerações decorre do instinto natural de conservação. Faz parte do processo evolutivo, como força moderadora dos impulsos de renovação. Mas os jovens representam a renovação em marcha e cabe-nos o dever de procurar compreendê-los, nunca o de exclui-los ou de querer reduzi-los a
conservadores forçados ou fingidos. As velhas gerações vão passando e as novas poderão impor-se através de processos violentos, como reação às opressões sofridas.


O grau atual de desenvolvimento da inteligência humana permite-nos compreender perfeitamente esse processo da dialética da evolução e contribuirmos para manter o equilíbrio necessário na fase de transição que atravessamos. Muitos pedagogos, como Dewey, Kilpatrick, Hubert, Kerschensteiner, lutaram e vêm lutando para estabelecer um tipo adequado de educação a uma civilização em mudança. Essa adequação não pode prescindir de uma compreensão mais ampla do problema espiritual, superando o equívoco do laicismo e da formação sectária de tipo igrejeiro. A Educação Espírita apresenta-se como mediadora para a solução desse problema, oferecendo contribuições decisivas, mas infelizmente o próprio meio espírita não se mostra capaz de compreender o que seja educação espírita.


A única revista especializada do mundo, nesse setor de importância vital para este momento, foi lançada em São Paulo pela editora Edicel, sem finalidade comercial e não está podendo sustentar-se, ante o desinteresse geral, que abrange até mesmo a rede escolar espírita. A inteligência espírita, apegada a um misticismo antidoutrinário, revela-se tão inepta quanto os rabinos do Templo de Jerusalém, no tempo de Jesus, para compreender o seu dever na hora atual. Essa é uma responsabilidade muito mais grave do que geralmente se pensa, nesta hora de transição. E não só os espíritas devem arcar com ela, mas todos os homens de inteligência e cultura que podem contribuir para o esclarecimento popular.



UMA TOMADA DE CONSCIÊNCIA


O apego ao contingente, ao imediato, apaga na consciência dos nossos dias o senso da responsabilidade espiritual. Nem mesmo a ronda constante da morte consegue arrancar o homem atual da embriaguez do presente. O problema do espírito e da imortalidade só se aviva quando ligado diretamente a questões de interesse pessoal. O católico, o protestante e o espírita se equivalem nesse sentido. Todos buscam os caminhos do espírito para a solução de questões imediatistas ou para garantirem a si mesmos uma situação melhor depois da morte.


A maioria absoluta dos espiritualistas está sempre disposta a investir (este é o termo exato) em obras assistenciais, mas revela o maior desinteresse pelas obras culturais.


Apegam-se os religiosos de todos os matizes à tábua de salvação da caridade material, aplicando grandes doações em hospitais, orfanatos e creches, mas esquecendo-se dos interesses básicos da cultura. Garantem os juros da caridade no pós-morte, mas contraem pesadas dívidas no tocante à divulgação, sustentação e defesa de princípios fundamentais da renovação da cultura planetária.


A imprensa, a literatura, o ensaio, o estudo, a fixação das linhas mestras da nova cultura terrena ficam ao deus-dará. Falta uma tomada de consciência, particularmente no meio espírita, da responsabilidade de todos na construção e na elaboração da Nova Era, que é trabalho dos homens na Terra.


Ninguém ou quase ninguém compreende que sem uma estruturação cultural elevada, sem estudos aprofundados no plano cultural, que revelem as novas dimensões do mundo e do homem na perspectiva espírita, o Espiritismo não passará de uma seita religiosa de fundo egoísta, buscando a salvação pessoal de seus adeptos, precisamente
aquilo que Kardec lutou para evitar.


A finalidade do Espiritismo, como Kardec acentuou, não é a salvação individual, mas a transformação total do mundo, num vasto processo de redenção coletiva.


Proporcionar aos jovens uma formação cultural apoiada na mais positiva e completa base espiritual, que mostre a insensatez das concepções materialistas e pragmatistas, dando-lhes a firmeza necessária na sustentação e defesa dos princípios doutrinários, não é só caridade, mas também realização efetiva dos objetivos superiores do Espiritismo nesta fase de transição. Sem esse trabalho não poderemos avançar com segurança e eficácia na direção da Era do Espírito. Temos de dar às novas gerações a possibilidade de afirmarem, diante do desenvolvimento das Ciências e do avanço geral da Cultura, como disse Denis Bradley: “Eu não creio, eu sei!”


Porque é pelo saber, e não pela crença, pela fé racional e não pela fé cega, pelo conhecimento e não pelas teorias indemonstráveis que o Espiritismo, como revelação espiritual, terá de modelar a nova realidade terrena, apoiado na confirmação científica, pela pesquisa, dos seus postulados fundamentais. A revelação humana confirma e comprova a revelação divina.


Esse é o problema que ninguém parece compreender. Todos sonham com o momento em que a Ciência deverá proclamar a realidade do espírito. Mas, essa proclamação jamais será feita se a Ciência Espírita não atingir a maioridade, não se confirmar por si mesma, podendo enfrentar virilmente, no plano da inteligência e da cultura, a visão materialista do mundo e a concepção materialista do homem. Por isso precisamos de Universidades Espíritas, de Institutos de Cultura Espírita dotados de recursos para uma produção cultural digna de respeito, de Laboratórios de Pesquisa Psíquica estruturados com aparelhagem eficiente e orientados por metodologia segura, planejada e testada por especialistas de verdade, capazes de dominar o seu campo de trabalho e de enfrentar com provas irrefutáveis os sofismas dos negadores sistemáticos. É uma batalha que se trava, o bom combate de que falava o apóstolo Paulo, agora desenvolvido com todos os recursos da tecnologia.


Chega de pieguice religiosa, de palestras sem fim sobre a fraternidade impossível no meio de lobos vestidos de ovelhas.


Chega de caridade interesseira, de imprensa condicionada à crença simplória, de falações emotivas que não passam de formas de chantagem emocional. Precisamos da Religião viril que remodela o homem e o mundo na base da verdade comprovada. Da caridade real que não se traduz em esmolas, mas na efetivação da fraternidade humana oriunda do conhecimento de nossa
constituição orgânica e espiritual comuns, ou seja, da inelutável igualdade humana. De exposições sábias e profundas dos problemas do espírito, nascidas da reflexão madura e do estudo metódico e profundo. Temos de acordar os dorminhocos da preguiça mental e convocar a todos para as trincheiras da guerra incruenta da sabedoria contra a ignorância, da realidade contra a ilusão, da verdade contra a mentira. Sem essa revolução em nossos processos não chegaremos ao mundo melhor que já está
batendo, impaciente, às nossas portas.


Não façamos do Espiritismo uma ciência de gigantes em mãos de pigmeus. Ele nos oferece uma concepção realista do mundo e uma visão viril do homem. Arquivemos para sempre as pregações de sacristão, os cursinhos de miniaturas de anjos, à semelhança das miniaturas japonesas de árvores. Enfrentemos os problemas doutrinários na perspectiva exata da liberdade e da responsabilidade de seres imortais. Reconheçamos a fragilidade humana, mas não nos esqueçamos da força e do poder do espírito
encerrado no corpo. Não encaremos a vida cobertos de cinzas medievais. Não façamos da existência um muro de lamentações. Somos artesãos, artistas, operários, construtores do mundo e temos de construi-lo segundo o modelo dos mundos superiores que esplendem nas constelações. Estudemos a doutrina aprofundando-lhe os princípios. Remontemos o nosso pensamento às lições viris do Cristo, restabelecendo na Terra as dimensões perdidas do seu Evangelho. Essa é a nossa tarefa.



Fonte: Jornal “Mensagem”, órgão de divulgação do Grupo Espírita Cairbar Schutel, sob a direção de J. Herculano Pires - setembro de 1975 - ano I, nº 4 - São Paulo-SP.

José Herculano Pires (1914-1979), jornalista, poeta, filósofo, escritor e um dos maiores pensadores do espiritismo contemporâneo, é autor de mais de 80 obras sobre espiritismo, parapsicologia, educação, filosofia dentre outros temas.


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Paulo Cesar Fernandes

11 11 2013

20131111 José Herculano Pires_Pedagogia Espírita

José Herculano Pires

Pedagogia Espírita


O mistério do ser


A educação depende do conhecimento menor ou maior que o educador possua de si mesmo. Porque conhecer-se a si mesmo é o primeiro passo do conhecimento do ser humano. A Humanidade é uma só. O ser humano, em todas as épocas e em toda parte, foi sempre o mesmo.Sua constituição física, sua estrutura psicológica, sua consciência são iguais em todos os seres humanos.


Essa igualdade fundamental e essencial é o que caracteriza o homem. As diferenças temperamentais, culturais, de tipologia psicológica, de raça ou nacionalidade, de cor ou tamanho são apenas acidentais. Por isso mesmo a Educação é universal e seus objetivos são os mesmos em todas as épocas e em todas as latitudes da Terra.



Essa padronização, que devia simplificar a educação, na verdade a complica, porque por baixo do aspecto padronizador surgem as diferenciações individuais e grupais.


Cada indivíduo é único, diferente de todos os demais, mesmo nos grupos afins. O tipo psicológico de cada ser humano é único e irredutível à massa. O mistério do ser, que aturde os educadores, chama-se personalidade. Cada ser humano é uma pessoa. E o é desde o nascimento, pois já nasce formada com sua complicada estrutura que vai apenas desenvolver-se no crescimento e na relação social. É difícil para o educador dominar todas essas variações e orientá-las.



Educar, como se vê, é decifrar o enigma do ser em geral e de cada ser em particular, de cada educando. René Hubert, pedagogo francês contemporâneo, define a Educação como um ato de amor, pelo qual uma consciência formada procura elevar ao seu nível uma consciência em formação.



A Educação se apresenta, assim, como Ciência, Filosofia, Arte e Religião. É Ciência quando investiga as leis da complexa estrutura humana. E Filosofia quando, de posse dessas leis, procura interpretar o homem. E Arte quando o educador se debruça sobre o educando para tentar orientá-lo no desenvolvimento de seus poderes internos vitais e espirituais. E Religião porque busca a salvação do ser humano no torvelinho de todas as ameaças, tentações e perigos do mundo. O verdadeiro educador é o que
pratica a Religião verdadeira do amor ao próximo, naquilo que podemos chamar o Culto do Ser no templo do seu próprio ser.



Não se trata de uma imagem mística da Educação, mas de uma tentativa de vê-la, compreendê-la e aplicá-la em todas as suas dimensões. O ato de educar é essencialmente religioso. Não é apenas um ato de amor individual, do mestre para o discípulo, mas também um ato de integração e salvação. A Educação não procura
integrar o ser em desenvolvimento numa dada situação social ou cultural, mas na condição humana, salvando-o dos condicionamen-tos animais da espécie, elevando-o ao plano superior do espírito.



É fácil compreendermos como está longe de tudo isso o profissionalismo educacional do nosso tempo. Tinham razão os filósofos gregos quando condenaram o profissionalismo dos sofistas. Não se tratava apenas de uma diferenciação de classes sociais, mas da luta contra o abastardamento da Educação pelos que negavam a existência da verdade a troco de interesses imediatistas.



Como ajustar os fins superiores da Educação às exigências de uma civilização baseada no lucro? A falta de uma solução para esse ajustamento é a origem da crise universal da Educação em nosso tempo. Não obstante, a solução poderia ser encontrada na aplicação de processos vocacionais. Nenhum tipo de educação coletiva pode
ser eficiente se não estiver em condições de observar e orientar as tendências vocacionais.



O desenvolvimento da Era Cósmica, apenas iniciada com ,as conquistas atuais da Astronáutica, traz novos e graves problemas ao campo educacional. Toda a Terra está sendo afetada pela nova concepção do homem e da sua posição no Cosmos. O aceleramento do processo tecnológico está levando o homem a conhecer melhor a sua própria condição humana. O ceticismo dos últimos tempos vai cedendo lugar a um despertar de novas e grandiosas esperanças.


A Educação da Era Cósmica começa a nascer e os educadores começam a perceber que precisa renovar os processos educacionais.



Educar e amar

O mundo das crianças é diferente do mundo dos adultos.

É um mundo de sonhos e de aspirações nobres. Um mundo amoroso, cheio de ternura e ansiando por compreensão. Kardec escreveu que as crianças são espíritos que se apresentam no mundo com as vestes da inocência. Espíritos maduros que se fazem pequeninos e tenros para poderem entrar no Reino do Céu. Voltam à fonte da vida, renovam-se nas águas lustrais da esperança, recomeçam a existência com grandes planos de trabalho delineados no íntimo. São frágeis e parecem puros porque precisam atrair o amor da gente grande. Carecem de amor e imploram carinho.



As pesquisas pedagógicas entre as tribos selvagens revelam que as crianças tribais, ao contrário do que supunham alguns teóricos, não são tratadas com brutalidade mas com reserva e carinho. Para o selvagem a criança é como um estrangeiro que chega à tribo, mas um estrangeiro que pode ser amigo. Antes de integrá-la na vida social eles a mantêm em observação, procurando atraí-la com amor.


Depois dos rituais de integração, os adolescentes çontinuam a ser encarados com ternura e tratados com carinho.



A finalidade dessas pesquisas é favorecer a descoberta da verdadeira natureza da educação. Nos povos civilizados a educação aparece muito complexa, revestida de numerosos artificios técnicos e teóricos, perturbada por sofismas e sujeita a interesses múltiplos. Nos povos selvagens ela pode ser observada na fonte, está ainda pura e nua como a verdade. E o que as pesquisas revelam é que a educação, na sua verdadeira essência, é um ato de amor pelo qual as consciências maduras agem sobre as imaturas para elevá-las ao seu nível.



Educar é amar, porque a mecânica da educação é a ajuda, o amparo, o estímulo. A vara, o ponteiro, a palmatória, as descomposturas e os gritos pertencem à domesticação e não à educação. A violência contra a criança é um estímulo negativo que desperta as suas reações inferiores, acorda a fera do passado na criaturinha vestida de inocência que Deus nos enviou. Só o amor educa, só a ternura faz as almas crescerem no bem.


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Lembrete aos educadores de todo mundo. Educar é amar.


Sem o coração não há uma verdadeira Educação.
Preparar uma aula. Dar uma aula não é educar.


O Pedagogo transcende todo tarefismo. Homens como Professor Paulo Freire, Professor Altivo Ferreira e Professor José Herculano Pires são elementos modelares nas atividades a que se propunham.


Minha pequena homenagem a esses verdadeiros professores e pedagogos com os quais tive a alegria de partilhar momentos e assistir palestras.



Paulo Cesar Fernandes

11 11 2013

20131111 Primórdios da individualidade


José Herculano Pires

O espírito e o tempo

 

Capítulo 3

 

Horizonte civilizado: mediunismo oracular

 

Nos Estados Teológicos, a estrutura política assemelha-se à estrutura metafísica ou divina. A Religião e o Estado se modelam reciprocamente, uma sobre o outro, e vice-versa. A classe sacerdotal, racionalmente organizada, elabora os mitos no plano intelectual, criando a teologia, estruturando o ritualismo, estabelecendo a genealogia dos deuses e as formas de relações entre estes e os homens.

 

A teogamia egípcia, de que já tratamos, é um dos mais perfeitos exemplos dessas formas de relações: a genealogia divina se prolonga na genealogia humana dos faraós, graças à fecundação da rainha por um deus. Amalgamados assim os dois poderes, o temporal e o divino, na própria carne dos monarcas, os Estados Teológicos tornam-se monolíticos.

 

Ainda na Grécia vemos isso: a figura humana de Zeus, na sua corte olímpica, refletindo no espaço a estrutura política da nação.

 

Murphy acentua esse aspecto do horizonte civilizado, da seguinte maneira:

 

“No horizonte que chamamos civilizado, a religião reflete o sistema político e social: é em geral politeísta, com um grupo de deuses semelhante ao Senado de uma República ou, mais frequentemente, à corte de um monarca supremo e mais ou menos autocrata. Os deuses são principalmente as forças da natureza, como anteriormente, sob o horizonte agrícola, mas, agora, mais profundamente personalizadas e dotadas de uma realidade dramática, que resulta do progresso da reflexão mental, entre as classes que dispuseram de lazer nessas antigas nações civilizadas.”

 

Os Espíritos presentes nesse horizonte — devemos acentuar, por nossa vez — são ainda os da tribo e os do horizonte agrícola, mas enriquecidos pela experiência e pelo desenvolvimento do pensamento abstrato.

 

Um novo Espírito, entretanto, marcará esse horizonte. Murphy considera o seu aparecimento, e com razão, como “acontecimento de imensa importância”.

 

Trata-se do “Espírito Civilizado”, como o chama Murphy, ou o que poderíamos chamar Espírito de Civilização. Esse Espírito se caracteriza por três funções especiais:

a capacidade de formulação de conceitos abstratos, de formulação de juízos éticos e morais, e de formulação de princípios jurídicos. Dessas funções surgirá o indivíduo, como a mais bela afirmação do horizonte civilizado.

 

ATENTAR PARA O TEXTO A SEGUIR:

 

Como vemos, o homem se liberta de si mesmo, da sua condição humana, construída penosamente através das estruturas sociais do horizonte tribal e do horizonte agrícola, procurando uma forma mais precisa de definição de sua natureza. Na organização tribal, ele se libertou da condição animal e do jugo absoluto das forças da natureza, para elaborar a sua condição própria. Na organização agrícola, ele aprendeu a dominar a natureza e submetê-la ao seu serviço, mas caiu prisioneiro da estrutura social. No horizonte civilizado, ele começa a romper os liames da organização social, para descobrir-se a si mesmo, o que só fará quando se tornar um indivíduo.

 

A evolução do Espírito está bem clara nesse imenso processo de desenvolvimento histórico da humanidade. O homem se eleva progressivamente da selva à civilização, através de períodos históricos que podem ser definidos como “horizontes”, ou seja, como universos próprios, nos quais os diferentes poderes da espécie vão sendo treinados em conjunto, até que o desenvolvimento da razão favoreça o processo de individualização.

 

Primeiramente, o homem se destaca da natureza através do conjunto tribal; depois, reafirma a sua independência através dos conjuntos mais amplos das civilizações agrárias; e, depois, ainda, constrói os conjuntos mais complexos das grandes civilizações orientais. Nestes conjuntos, porém, o homem descobre a possibilidade de destacar-se individualmente da estrutura social. O espírito humano se afirma como individualidade, como entidade autônoma, capaz de superar não somente a natureza, mas a própria humanidade.


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Temos aqui, nas palavras do Professor uma explicação e um traveling histórico da formação da individualidade, tão forte e tão valorizada nos nossos tempos.

Nunca, como nestes tempos líquidos a individualidade, a subjetividade foi tão falada e tão valorizada.

Uma subjetividade que, nascida com Descartes, adquire hoje o status e o valor a ela inerentes. Recebendo, inclusive uma ressignificação histórica, na medida em que a liberdade no seu mais profundo sentido se atou, aderiu, colou à essa mesma subjetividade.

Não se pode hoje, pelo menos no Ocidente, falar em subjetividade, sujeito, indivíduo, sem que, ao mesmo tempo nos venha a noção de Liberdade.

A derrocada de todas as instituições e de todas as institucionalidades vem exatamente da não compreensão desse novo momento histórico.

Não adianta. A Igreja, os Templos, os Centros Espíritas, Templos Budistas, etc. tudo isso tende a minguar no número de pessoas presentes.

Toda tentativa dessas instituições em ampliar o número de adeptos acabará caindo no ridículo. Será a demonstração cabal da não compreensão do mundo na qual estão inseridas tais instituições.

Qual nossa tarefa enquanto espíritas? - Você deve estar se perguntando.

Divulgar a "Imortalidade do Espírito" para o conceito mais e mais fazer parte do senso comum. Possa impregnar o sentimento das massas. E quando digo massas me refiro a massas mesmo. No sentido sociológico ou marxista do termo.

Uma vez atingido esse estágio. Por lógica dedução as pessoas chegarão à Reencarnação, e ao inevitável processo da Evolução.

É o que basta. Isto posto, as decorrências éticas serão um desdobramento natural de tudo isso.

Será assim?

Não tenho como predizer ou definir que assim o seja.

Mas essa é minha atual perspectiva, a partir de todas as leituras espíritas e não espíritas feitas nos últimos cinco anos principalmente.

Não quero que concordem comigo, até prefiro a discordância sincera. Que esta me chegue através do espaço de Observações presente neste Blog.

Seu tempo na leitura deste texto é uma honra para mim. Obrigado.


Paulo Cesar Fernandes

11 11 2013