sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Similaridade entre Descartes e Kardec

Achei impressionante a similaridade entre esses dois pensadores racionalistas na forma de desenvolver o seu arrazoado.

Veja como a maneira de expor seu pensamento segue um desdobramento, um encadeamento que vão "empurrando" o leitor à desejada/colimada conclusão.

Verdade é que Kardec segue Descartes como se fosse este uma cartilha da forma de raciocinar. Sendo essa a forma de expor o pensamento daquele momento histórico. Tomemos além de Descartes a obra de Kant e a de Hegel.

É claro ser mais fácil para nós trilhar os caminhos de Descartes e Kardec devido ao fato de ser francesa a nossa tradição cultural.
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Quando falo em nossa tradição cultural penso em homens como Darcy Ribeiro; Benedito Nunes; Anisio Teixeira; Marilena Chauí e toda a Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo.

Seguem dois segmentos de texto de cada um dos pensadores para o  leitor fazer sua análise. Concordar ou discordar de mim. Mas pensar autonomamente, assim espero:

A editora Martins Fontes, aqui no Brasil, lançou este texto como "Regras para orientação do Espírito".

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Rene Descartes - Regras para a direção (orientação) do Espírito.

REGRA I

A finalidade dos estudos deve ser a orientação do espírito para emitir juízos sólidos e verdadeiros sobre tudo o que se lhe depara.
Os homens costumam, sempre que reconhecem alguma semelhança entre duas coisas, avaliar ambas, mesmo naquilo em que são diversas, mediante o que reconheceram numa delas como verdadeiro.

Realizam assim falsas aproximações entre as ciências, que consistem exclusivamente no conhecimento intelectual, e as artes, que exigem algum exercício e hábito corporal; e vêem que nem todas as artes devem ser aprendidas simultaneamente pelo mesmo homem e que só aquele que exerce uma única se transforma mais facilmente num artista consumado; as mesmas mãos que se dedicam a cultivar os campos e a tocar cítara, ou que se entregam a vários ofícios diferentes, não os podem executar com tanto desafogo como se a um só se dedicassem. Julgaram que o mesmo se passaria com as ciências e, ao distingui-las umas das outras segundo a diversidade dos seus objetos, pensaram que era necessário adquirir cada uma separadamente, deixando de lado todas as outras.

Enganaram-se rotundamente. Com efeito, visto que todas as ciências nada mais são do que a sabedoria humana, a qual permanece sempre una e idêntica, por muito diferentes que sejam os objetos a que se aplique, e não recebe deles mais distinções do que a luz do sol da variedade das
coisas que ilumina, não há necessidade de impor aos espíritos quaisquer limites. Nem o conhecimento de uma só verdade, como se fora a prática de uma única arte, nos desvia da descoberta de outra; pelo contrário, ajuda-nos. Sem dúvida, parece-me de espantar que a maior parte indague, com o maior empenho, os costumes dos homens, as propriedades das plantas, os movimentos dos astros, as transmutações dos metais e os objetos de semelhantes disciplinas e que, entretanto, quase ninguém pense no bom senso ou nesta Sabedoria universal, quando tudo o mais deve ser apreciado, não tanto por si mesmo quanto pelo contributo que a esta traz. Assim, não é sem motivo que pomos esta regra antes de todas as outras, porque nada nos afasta tanto do reto caminho da procura da verdade como orientar os nossos estudos, não para este fim geral, mas para alguns fins particulares.

Não falo já dos maus e condenáveis, como a vã glória ou o lucro vergonhoso: é óbvio que as razões de mau quilate e os embustes próprios dos espíritos vulgares abrem neste sentido um caminho muito mais vantajoso do que o poderia fazer o sólido conhecimento daverdade.

Mas pretendo falar dos fins honestos e louváveis, porque mais subtilmente somos por eles muitas vezes enganados: por exemplo, ao procurarmos adquirir as ciências úteis para o bem-estar da existência ou para o prazer que se encontra na contemplação da verdade, e que é quase a única
felicidade completa nesta vida e que nenhuma dor vem perturbar. São estes os frutos legítimos das ciências que efetivamente podemos esperar; mas, se neles pensarmos durante o estudo, fazem muitas vezes que omitamos muitos meios necessários para o conhecimento de outras coisas, porque
se afigurarão, à primeira vista, ou pouco úteis ou pouco dignos de interesse. É preciso acreditar que todas as ciências estão de tal modo conexas entre si que é muitíssimo mais fácil aprendê-las todas ao mesmo tempo do que separar uma só que seja das outras. Portanto, se alguém quiser investigar
a sério a verdade das coisas, não deve escolher uma ciência particular: estão todas unidas entre si e dependentes umas das outras; mas pense apenas em aumentar a luz natural da razão, não para resolver esta ou aquela dificuldade de escola, mas para que, em cada circunstância da vida, o
intelecto mostre à vontade o que deve escolher. Em breve ficará espantado de ter feito progressos muito superiores aos de quantos se dedicam a estudos particulares, e de ter obtido não só tudo o que os outros desejam, mas ainda coisas mais elevadas do que as que podem esperar.

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Allan Kardec  -  Livro dos Médiuns

PRIMEIRA PARTE

Noções preliminares

CAPÍTULO I

HÁ ESPÍRITOS?

1. A dúvida, no que concerne à existência dos Espíritos, tem como causa primária a ignorância acerca da verdadeira natureza deles. Geralmente, são figurados como seres à parte na criação e de cuja existência não está demonstrada a necessidade.

Muitas pessoas, mais ou menos como as que só conhecem a História pelos romances, apenas os conhecem através dos contos fantásticos com que foram acalentadas em criança. Sem indagarem se tais contos, despojados dos acessórios ridículos, encerram algum fundo de verdade, essas pessoas nunicamente se impressionam com o lado absurdo que eles revelam. Sem se darem ao trabalho de tirar a casca amarga, para achar a amêndoa, rejeitam o todo, como fazem, relativamente à religião, os que, chocados por certos abusos, tudo englobam numa só condenação.

Seja qual for a idéia que dos Espíritos se faça, a crença neles necessariamente se funda na existência de um princípio inteligente fora da matéria.

Essa crença é incompatível com a negação absoluta deste princípio. Tomamos, conseguintemente, por ponto de partida, a existência, a sobrevivência e a individualidade da alma, existência, sobrevivência e individualidade que têm no Espiritualismo a sua demonstração teórica e dogmática e, no Espiritismo, a demonstração positiva. Abstraiamos, por um momento, das manifestações propriamente ditas e, raciocinando por indução, vejamos a que conseqüências chegaremos.

2. Desde que se admite a existência da alma e sua individualidade após a morte, forçoso é também se admita: 1º, que a sua natureza difere da do corpo, visto que, separada deste, deixa de ter as propriedades peculiares ao corpo; 2º, que goza da consciência de si mesma, pois que é passível de
alegria, ou de sofrimento, sem o que seria um ser inerte, caso em que possuí-la de nada nos valeria.

Admitido isso, tem-se que admitir que essa alma vai para alguma parte. Que vem a ser feito dela e para onde vai? Segundo a crença vulgar, vai para o céu, ou para o inferno. Mas, onde ficam o céu e o inferno?

Dizia-se outrora que o céu era em cima e o inferno embaixo. Porém, o que são o alto e o baixo no Universo, uma vez que se conhecem a esfericidade da Terra, o movimento dos astros, movimento que faz com que o que em dado instante está no alto esteja, doze horas depois, embaixo, e o infinito
do espaço, através do qual o olhar penetra, indo a distâncias consideráveis? Verdade é que por lugares inferiores também se designam as profundezas da Terra.

Mas, que vêm a ser essas profundezas, desde que a Geologia as esquadrinhou? Que ficaram sendo, igualmente, as esferas concêntricas chamadas céu de fogo, céu das estrelas, desde que se verificou que a Terra não é o centro dos mundos, que mesmo o nosso Sol não é único, que milhões de sóis brilham no Espaço, constituindo cada um o centro de um turbilhão planetário? A que ficou reduzida a importância da Terra, mergulhada nessa imensidade? Por que injustificável privilégio este quase imperceptível grão de areia, que não avulta pelo seu volume, nem pela sua posição, nem
pelo papel que lhe cabe desempenhar, seria o único planeta povoado de seres racionais? A razão se recusa a admitir semelhante nulidade do infinito e tudo nos diz que os diferentes mundos são habitados. Ora, se são povoados, também fornecem seus contingentes para o mundo das almas.

Porém, ainda uma vez, que terá sido feito dessas almas, depois que a Astronomia e a Geologia destruíram as moradas que se lhes destinavam e, sobretudo, depois que a teoria, tão racional, da pluralidade dos mundos, as multiplicou ao infinito?

Não podendo a doutrina da localização das almas harmonizar-se com os dados da Ciência, outra doutrina mais lógica lhes assina por domínio, não um lugar determinado e circunscrito, mas o espaço universal: formam elas um mundo invisível, em o qual vivemos imersos, que nos cerca e
acotovela incessantemente. Haverá nisso alguma impossibilidade, alguma coisa que repugne à razão?

De modo nenhum; tudo, ao contrário, nos afirma que não pode ser de outra maneira.

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É admirável a superioridade de linguagem, e a limpeza de raciocínio desses dois mestres.

Espero que isso possa ter servido/acrescentado algo ao seu espirito crítico. E possa ser motivo de reflexão.

Paulo Cesar Fernandes

30  11  2012

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Reflexão 29 11 2012 - Kardec e a Filosofia

Kardec e a Filosofia

Retomando a leitura de O livro dos Médiuns de Allan Kardec, como item diário de estudo ao final de cada tarde, hoje me deparei com um trecho digno de destaque no que se refere à Filosofia.

Peço ao leitor anotar em sua mente e tirar as conclusões próprias. Minha tarefa é trazer à luz a questão.

Volto a dizer: não é minha intenção ter seguidores.


Pelo contrário. Distante disso estou. Não sou ditador!


Peço das pessoas a busca da autonomia no pensar. Já tivemos muitos séculos de "homens dominando outros homens"; do "homem lobo do homem". Precisamos inaugurar um novo tempo.


Daí o que menos desejo é liderar alguém.


Minha luta é ter pessoas livres, e de opiniões divergentes ao meu redor. Toda unanimidade é burra, e capaz de tornar os espíritos cada vez mais preguiçosos nas tarefas do pensar.

Um marcar passo espiritual.


O Movimento Espírita históricamente tem os seus "donos da verdade" cujas idéias a multidão de seres não pensantes segue sem lhe por reparos.


Já é tempo de libertação!


Pense! Repense! Seja Livre! Seja autonomo!

Dito isto, coloco o trecho do Livro dos Médiuns para sua análise:


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Allan Kardec

Livro dos Médiuns

Introdução


Desde alguns anos, o Espiritismo há realizado grandes progressos: imensos, porém, são os que conseguiu realizar, a partir do momento em que tomou rumo filosófico, porque entrou a ser apreciado pela gente instruída. Presentemente, já não é um espetáculo: é uma doutrina de que não mais riem os que zombavam das mesas girantes. Esforçando-nos por levá-lo para esse terreno e por mantê-lo aí, nutrimos a convicção de que lhe granjeamos mais adeptos úteis, do que provocando a torto e a direito manifestações que se prestariam a abusos. Disso temos cotidianamente a prova em o número dos que se hão tornado espíritas unicamente pela leitura de “O Livro dos Espíritos”.

Depois de havermos exposto, nesse livro, a parte filosófica da ciência espírita, damos nesta obra a parte prática, para uso dos que queiram ocupar-se com as manifestações, quer para fazerem pessoalmente, quer para se inteirarem dos fenômenos que lhes sejam dados observar. Verão, aí, os óbices com que poderão deparar e terão também um meio de evitá-los. Estas duas obras, se bem a segunda constitua seguimento da primeira, são, até certo ponto, independentes uma da outra. Mas, a quem quer que deseje tratar seriamente da matéria, diremos que primeiro leia “O Livro dos Espíritos”, porque contém princípios básicos, sem os quais algumas partes deste se tornariam talvez dificilmente compreensíveis.


                                                                    Allan Kardec


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Ressalto aqui a necessidade da Filosofia em dois sentidos:

1. Olhar o espiritismo como uma filosofia, uma filosofia de vida a impactar nossa existência no que diz respeito às nossas posturas éticas;

2. Ter no Estudo da Filosofia e de sua história, um elemento complementar ao estudo das obras espiritas. Isto apenas nos ajudará a melhor compreender muitos tópicos tratados por Kardec. E nos ampliará de grande monta os horizontes culturais.


Reflita!

Paz em teu coração!


Paulo Cesar Fernandes

29  11  2012