terça-feira, 25 de agosto de 2015

20150825 Jean Reynaud

Prezados amigos.

Algumas coisas, por sua força e por sua veracidade me vejo obrigado a trazer ao conhecimento de um público maior.

Não só por quem assina. Não só pelo exemplo de vida de Jean Reynaud. Mas principalmente para estar em paz com minha consciência, dando a conhecer um texto de grande envergadura moral, muito bem escrito, trazendo dentro de si uma esperança profunda; diria mesmo a certeza num futuro melhor para a humanidade terrestre.

Caso alguém tenha dificuldades com o Espiritismo não o leia. É um texto espírita, e de grande instrução para todos nós. Todos nós admiradores da virtude. 


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REVISTA ESPIRITA

JORNAL DE ESTUDOS PSICOLÓGICOS

6a ANO NO. 8 AGOSTO 1863

JEAN REYNAUD E OS PRECURSORES DO ESPIRITISMO.






A nosso turno, viemos lançar algumas flores sobre o túmulo recentemente fechado de um homem tão recomendável pelo seu saber quanto por suas eminentes qualidades morais, e ao qual, coisa rara, todos os partidos concordam em render justiça.


Jean Reynaud, nascido em Lyon, em fevereiro de 1808, morreu em Paris a 28 de junho de 1863. Não saberíamos dar uma ideia mais justa de seu caráter senão reproduzindo a curta e tocante notícia necrológica que seu amigo, o Sr. Ernest Legouvé, publicou no Siècle de 30 de junho de 1863.


"A democracia, a filosofia, e, não temo dize-lo, a religião, acabam de ter uma perda imensa: Jean Reynaud morreu ontem depois de uma curta doença. De qualquer ponto de vista que se julguem suas doutrinas, sua obra, como sua vida, foi eminentemente religiosa; porque sua vida, como sua obra, foi um dos protestos mais 
eloquentes contra o grande flagelo que nos ameaça: o ceticismo sob todas as formas. Ninguém acreditou mais energicamente na 
personalidade divina, ninguém acreditou mais energicamente na personalidade humana, ninguém amou mais ardentemente a liberdade. 

Em seu livro Terra e Céu, que cavou desde o início um sulco tão profundo, cujo traço ir-se-á se marcando sempre mais, nesse livro respira um tal sentimento do infinito, um tal sentimento da presença divina, que se pode dizer que Deus ali palpita em cada página! E como poderia sê-lo de outro modo, quando aquele que as escreveu, vivia sempre em presença de Deus! Sabemos bem, nós todos que o conhecemos, o amamos, e cujo mais belo título de honra é de termos sido amados por um tal homem. Era uma fonte de vida moral sempre a jorrar; não se podia aproximar-se dele sem estar mais assegurado no bem; só seu rosto era uma lição de justiça, de honra, de devotamento; as almas decaídas se perturbam diante desse claro olhar como diante do próprio olhar da justiça: e tudo isto partiu! partiu em plena força, quando tantas palavras úteis, tantos grandes exemplos poderiam ainda sair dessa boca, desse coração!... Não choramos Reynaud só por nós, nós o choramos por nosso país inteiro."


E. LEGOUVÉ




O Sr. Henri Martin, no mesmo jornal de 16 de julho, deu sobre a vida e as obras de Jean Reynaud detalhes mais circunstanciados. 



"Educado, disse ele, na liberdade do campo por uma mãe de alma forte e terna, foi lá que tomou esses hábitos de intimidade com a Natureza que não o deixaram jamais, e se formaram esses órgãos robustos com os quais, mais tarde, fazia vinte léguas de um fôlego, e passava de geleira a geleira, de uma crista a outra dos Alpes, em estreitas cornijas onde não se arriscavam os caçadores de camurças. 

Seus estudos foram rápidos e fecundos; tudo se manifestando desde sua juventude o gosto mais vivo pelas letras e por todas as formas do belo, voltou de início seus objetivos futuros para as ciências, feliz direção que lhe deveria fornecer os alimentos e os instrumentos de seu pensamento, e fazer do sábio útil o servidor do filósofo. Saído em primeiro lugar da Escola Politécnica, era engenheiro de minas em Corse, no momento da revolução de julho. Retornou a Paris; o saint-simonismo ali vinha de explodir; foi envolvido nesse grande e singular movimento que tomava, então, tantas jovens inteligências pelo atrativo do dogma da perfectibilidade do gênero humano. 

escola, no entanto, pretendia se tornar uma igreja; Jean Reynaud não a seguiu; deixou o saint-simonismo pela democracia; tratou de reconstituir um grupo e um centro de ação intelectual com os amigos que dele tinham se separado ao mesmo tempo que ele. Pierre Leroux, Carnot e ele retomam das mãos de Julien (de Paris) a Revista Enciclopédica; foi lá que Pierre Leroux publicou seu notável Ensaio sobre a doutrina do progresso contínuo, e Jean Reynaud o trecho tão surpreendente do Infinito dos céus, germe de seu grande livro Terra e Céu. Fundou em seguida, com Pierre Leroux, a Enciclopédia Nova, obra imensa que permaneceu inacabada.

O 24 de fevereiro arrancou o filósofo de seus pacíficos trabalhos para lançá-lo na política ativa. Presidente da comissão dos altos estudos científicos e literários, depois subsecretário de Estado no ministério da Instrução Pública, e elaborou com o ministro Carnot, um de seus mais antigos e de seus mais constantes amigos, os planos destinados a pôr a instrução pública ao nível das instituições democráticas. Da Instrução Pública transferido para o Conselho de Estado, Jean Reynaud ali ganhou rapidamente uma autoridade que procedia de seu caráter quanto de suas luzes, e, tão curta que tenha sido sua passagem, ali deixou, na memória dos homens especiais mais eminentes, uma impressão inapagável."




De todos os escritos de Jean Reynaud, aquele que mais contribuiu para a sua popularidade, sem contradita, foi seu livro Terra e Céu, embora a forma abstrata da linguagem o coloque à altura de todo o mundo; mas a profundeza das idéias e a lógica das deduções o fizeram apreciado de todos os pensadores sérios, e colocaram o autor na primeira linha dos filósofos espiritualistas. Essa obra pareceu, à Igreja, um perigo para a ortodoxia da fé; em 
conseqüência disso foi condenado e colocado no Index pela corte de Roma, o que aumentou ainda o crédito do qual já gozava e fê-lo procurar com mais avidez. Na época em que apareceu essa obra, em torno de 1840, não havia ainda a questão dos Espíritos, e, no entanto, Jean Reynaud parece ter tido, como de resto muitos outros escritores modernos, a intuição e o pressentimento do Espiritismo, do qual foi um dos mais eloquentes precursores. Como Charles Fourier, admite o progresso indefinido da alma, e, como conseqüência desse progresso, a necessidade da pluralidade das existências pelos diversos estados do homem sobre a Terra.


Jean Reynaud nada tinha visto; tudo hauriu em sua profunda intuição. O Espiritismo viu o que o filósofo não fez senão pressentir; acrescenta assim a sanção da experiência à teoria puramente especulativa, e a experiência lhe fez naturalmente descobrir os pontos de detalhe que só a imaginação pode entrever, mas que vêm completar e corroborar os pontos fundamentais. Como todas as grandes idéias que revolucionaram o mundo, o Espiritismo não eclodiu subitamente; germinou em mais de um cérebro, mostrou-se, aqui e ali, pouco a pouco, como para habituar os homens a essa ideia; uma brusca aparição completa teria encontrado uma resistência muito viva: teria deslumbrado sem convencer.


Cada coisa, aliás, deve vir a seu tempo, e toda planta deve germinar e crescer antes de atingir seu inteiro desenvolvimento. Ocorre o mesmo em política; não há nenhuma revolução que não tenha sido elaborada de longa data, e alguém que, guiado pela experiência e pelo estudo do passado, seguindo atentamente essas preliminares, pode, quase infalivelmente, sem ser profeta, prever-lhe o desenlace. Foi assim que os princípios do Espiritismo moderno se mostraram parcialmente e sob diferentes faces em várias épocas: no século último, em Swedenborg; no começo deste século, na doutrina dos teósofos, que admitiam claramente as comunicações entre o mundo visível e o mundo invisível; em Charles Fourier, que admite os progressos da alma pela reencarnação; em Jean Reynaud, que admite o mesmo princípio, sondando o infinito, a ciência à mão; há uma dúzia de anos, nas manifestações americanas que tiveram uma tão grande repercussão e vieram provar as relações materiais entre os mortos e os vivos, e, finalmente, na filosofia espírita, que reuniu esses diversos elementos em corpo de doutrina e deduziu-lhes as
conseqüências morais. Quem teria dito, então, quando se ocupavam das mesas girantes, que desse divertimento sairia toda uma filosofia? Quando essa filosofia apareceu, quem teria dito que, em alguns anos, ela faria a volta ao mundo e conquistaria milhões de adeptos?


Hoje, quem poderia afirmar que ela disse a sua última palavra? Não, certamente, não a disse; se as bases fundamentais lhe estão estabelecidas, há ainda muitos pontos de detalhe a elucidar e que virão ao seu turno; depois, quanto mais se avança, mais se vê quanto são múltiplos os interesses nos quais ela toca, porque, pode se dizer sem exagero, toca a todas as questões da ordem social; só o futuro pode, pois, desenvolver-lhe todas as conseqüências, ou, melhor dizendo, essas conseqüências se desenvolverão por si mesmas pela força das coisas, porque se encontra no Espiritismo o que inutilmente se procurou em outro lugar; por isto mesmo ser-se-á conduzido a reconhecer que só ele pode encher o vazio moral que se faz, cada dia, em torno do homem, vazio que ameaça a própria sociedade em sua base, e do qual começa-se ela se assustar. Em um dado momento o Espiritismo será a âncora de salvação; mas não seria preciso esperar esse momento para lançar a corda de salvamento, do mesmo modo que não se espera o momento em que se tem necessidade da colheita para semear. A Providência, em sua sabedoria, prepara as coisas há muito tempo; por isso a ideia-mãe teve, como dissemos, numerosos precursores que abriram o caminho e prepararam o terreno para receber a semente, uns em um sentido, os outros em outro, e reconhecer-se-á, um dia, por que fios numerosos todas essas idéias parciais se ligam à ideia fundamental; ora, cada uma dessas idéias tendo seus partidários, disso resulta neles uma predisposição muito natural a aceitar o complemento da ideia, cada uma dessas teorias tendo desmontado uma porção do terreno; aí, sem contradita, está uma das causas dessa propagação que se prende ao prodígio, e da qual a história das doutrinas filosóficas não oferece nenhum exemplo; já os adversários se espantam com a resistência que apresenta aos seus ataques; mais tarde deverão ceder diante da força da opinião.


Entre os precursores do Espiritismo é preciso ainda colocar uma multidão de escritores contemporâneos, cujas obras estão semeadas, talvez com seu desconhecimento, de idéias espíritas. Haveria volumes a fazer se se quisesse recolher as inumeráveis passagens onde está feita uma alusão, mais ou menos direta, da preexistência e da sobrevivência da alma, de sua presença entre os vivos, de suas manifestações, de suas peregrinações através dos mundos progressivos, da pluralidade das existências, etc. 


Admitindo que isso não seja, da parte de certos autores, senão um jogo de imaginação, a ideia não se infiltra menos no espírito das massas onde está latente até o momento em que será demonstrada como uma verdade. É um pensamento mais espírita que aquele que encerra a carta do Sr. Victor Hugo sobre a morte da senhora Lamartine, e que a maioria dos jornais aclamou com entusiasmo, mesmo aqueles que mais censuram sobre a crença nos Espíritos? Eis essa carta, que disso diz muito em algumas linhas:


     Hauteville-House, 23 de maio.

     Caro Lamartine,

     Uma grande infelicidade nos fere; tenho necessidade de colocar      meu coração perto do vosso. Venero aquilo que amais. O vosso        alto espírito vê além do horizonte; percebeis distintamente a            vida futura.

     Não é a vós que é necessário dizer: Esperai. Sois daqueles que          sabem e que esperam.

     Ela é sempre a vossa companheira, invisível, mas presente.              Perdestes a mulher, mas não a alma. Caro amigo, vivamos nos        mortos.


Victor Hugo



Não são apenas os escritores isolados que semeiam, aqui e ali, algumas idéias, é a própria ciência que vem preparar os caminhos. O magnetismo foi o primeiro passo para o conhecimento da ação perispiritual, fonte de todos os fenômenos espíritas; o sonambulismo foi a primeira manifestação de isolamento da alma. A frenologia provou que o organismo cerebral é um chaveiro a serviço do princípio inteligente para a expressão das diversas faculdades; contrariamente à intenção de Gall, seu fundador, que era materialista, serviu para provar a independência do Espírito e da matéria. A homeopatia, provando a força da matéria espiritualizada, se liga ao papel importante que o perispírito desempenha em certas afecções; ela ataca o mal em sua própria fonte que está fora do organismo, do qual a alteração não é senão consecutiva. Tal é a razão pela qual a homeopatia triunfa numa multidão de casos onde a medicina comum fracassa: mais do que isto, toma em conta o elemento espiritualizado tão preponderante na economia, o que explica a facilidade com a qual os médicos homeopatas aceitam o Espiritismo, e porque a maior parte dos médicos espíritas pertence à escola de Hahnemann. Até as recentes descobertas sobre as propriedades da eletricidade não há, enfim, as que não vieram trazer seu contingente na questão que nos ocupa, lançando sua parte de luz sobre o que se poderia chamar a fisiologia dos Espíritos.


Nisso não terminaríamos mais se quiséssemos analisar todas as circunstâncias, pequenas ou grandes, que há meio século vieram abrir o caminho à filosofia nova; veríamos as doutrinas mais contraditórias provocarem um desenvolvimento da ideia, os próprios acontecimentos políticos prepararem a sua introdução na vida prática; mas de todas essas causas, a mais preponderante, é a Igreja, que parece predestinada a impeli-lo fatalmente. Tudo lhe vem em ajuda, e conhecendo-se a inumerável quantidade de documentos que nos chegam de todas as partes; se se pudesse seguir, como estamos em condições de fazê-lo, essa marcha providencial através do mundo, favorecida pelos acontecimentos menos esperados, e que, à primeira vista, pareceriam serem-lhe contrários, compreender-se-ia melhor ainda o quanto ela é irresistível, e se admiraria menos de nossa impassibilidade; é que vemos todo mundo nele trabalhar, de boa vontade ou à força, voluntariamente ou involuntariamente; é que vemos o objetivo, e que sabemos quando e como será alcançado; vemos o conjunto que avança, é por isso que nos inquietamos pouco com algumas individualidades que vão obliquamente.


Jean Reynaud foi, pois, um precursor do Espiritismo por seus escritos; também ele tinha sua missão providencial e deveria sulcar um campo; ser-lhe-á ainda útil depois de sua morte. Um eminente Espírito deu a apreciação seguinte sobre esse acontecimento: 


Ainda uma circunstância que vai resultar em proveito do Espiritismo. Jean Reynaud havia cumprido o que devia fazer nesta última existência; vai se falar de sua morte, de sua vida, e mais do que nunca de suas obras; ora, falar de suas obras é colocar um pé no caminho do Espiritismo. Muitas inteligências aprenderão a nossa crença querendo estudar esse filósofo que se fez autoridade; comparar-se-á, e ver-se-á que não sois loucos como o pretendem aqueles que riem de vós e de vossa fé. Tudo o que Deus fez está bem feito, crede-me. Ele será louvado pelos vossos próprios detratores, e sabeis que são eles que, sem o querer, mais trabalham para vos fazer adeptos. Deixai fazer, deixai gritar, tudo será segundo a vontade de Deus. Ainda um pouco de paciência, e a elite dos homens inteligentes e de saber se juntará a vós, e diante de certas adesões ostensivas, a crítica deverá abaixar a voz.



SANTO AGOSTINHO