segunda-feira, 21 de outubro de 2013

20131021 Leon Denis Do Ser do Destino e da Dor I


Leon Denis Do Ser do Destino e da Dor I


Leon Denis "O problema do ser do destino e da dor"   (1908


INTRODUÇÃO



Uma observação dolorosa surpreende o pensador na velhice. Ela se torna ainda mais lastimável em conseqüência das impressões experimentadas em seu giro pelo mundo espiritual, e ele então reconhece que o ensinamento ministrado pelas instituições humanas em geral – religiões, escolas, universidades –, se nos ensinam muitas coisas supérfluas, em compensação não nos ensinam quase nada do que mais temos necessidade de conhecer para a nossa conduta: a direção da existência terrestre e a
preparação para o além. Aqueles a quem cabe a alta missão de esclarecer e guiar a alma humana parecem ignorar sua natureza e seus verdadeiros destinos.


Nos meios universitários, uma completa incerteza ainda reina sobre a solução do problema mais importante com que o homem se defronta no decorrer de sua passagem pela Terra. Essa incerteza se reflete em todo o ensino. Uma boa parte dos professores e pedagogos afasta sistematicamente de suas lições tudo o que se refere ao problema da vida, às questões de seu objetivo e finalidade. Encontramos a mesma dificuldade nos líderes religiosos. Por suas afirmações desprovidas de provas, conseguem comunicar às almas sobre as quais têm responsabilidade apenas uma crença que não responde mais à lógica de uma crítica sã nem às exigências da razão.


A rigor, na universidade, assim como na Igreja, modernamente a alma encontra somente obscuridade e contradição em tudo que diz respeito ao problema de sua natureza e de seu futuro. É a esse estado de coisas que é preciso atribuir, em grande parte, os males de nosso tempo: a incoerência das idéias, a desordem da consciência, a anarquia moral e social. A educação dispensada às gerações é complicada: não lhes esclarece o caminho da vida e não as estimula para as lutas da existência. O ensino clássico habilita a cultivar, a ornar a inteligência, mas não ensina a agir, a amar, a se dedicar nem a alcançar uma concepção do destino que desenvolva as energias profundas do eu e oriente nossos impulsos, nossos esforços, para um objetivo elevado. No entanto, essa concepção é indispensável a todo ser, a toda sociedade, porque é o sustentáculo, a consolação suprema nas horas difíceis, a fonte das virtudes atuantes e das altas inspirações.


Carl du Prel relata o seguinte fato:


“Um dos meus amigos, professor da universidade, sentiu a dor de perder sua filha, o que reavivou nele o problema da imortalidade. Ele se dirigiu aos seus colegas, professores de filosofia, esperando encontrar consolação em suas respostas. Teve uma amarga decepção: havia pedido pão e lhe ofereciam pedra; procurava
uma afirmação e respondiam-lhe com um ‘talvez’.”



Francisque Sarcey, modelo completo do professor da universidade, escreveu: “Estou na Terra. Ignoro absolutamente como vim e como fui lançado aqui. Ignoro ainda mais como sairei daqui e o que acontecerá quando sair”.


Não se pode confessar mais francamente: a filosofia da escola, após tantos séculos de estudo e trabalho, ainda é apenas uma doutrina sem luz, sem calor, sem vida. A alma de nossos filhos, sacudida entre sistemas diversos e contraditórios – o positivismo de Augusto Comte, o naturalismo de Hegel, o materia lismo de Stuart Mill, o
ecletismo de Cousin, etc. –, flutua incerta, sem ideal, sem um objetivo preciso.


Daí o desânimo precoce e o pessimismo desanimador, doenças das sociedades decadentes, ameaças terríveis para o futuro, às quais se acrescenta o ceticismo amargo e zombeteiro de tantos jovens que acreditam apenas no dinheiro e honram apenas o sucesso. O ilustre professor Raoul Pictet assinala esse estado de espírito na introdução de sua última obra sobre as ciências psíquicas. Ele fala do efeito desastroso produzido pelas teorias materialistas sobre a mentalidade de seus alunos e conclui assim:


“Esses pobres jovens admitem que tudo o que se passa no mundo é efeito necessário e fatal de condições primárias, em que a vontade não intervém. Consideram que sua própria existência é, forçosamente, joguete da fatalidade inevitável, à qual estão ligados, de pés e mãos atados. Esses jovens param de lutar logo que encontram as primeiras dificuldades. Não acreditam mais em si mesmos. Tornam-se túmulos vivos, onde guardam, confusamente, suas esperanças, seus esforços, seus desejos, fossa comum de tudo o que lhes fez bater o coração até o dia do envenenamento. Tenho visto esses cadáveres diante de suas carteiras e no laboratório, e têm-me causado pena.”


Tudo isso não é somente aplicável a uma parte de nossa juventude, mas também a muitos homens de nosso tempo e de nossa geração, nos quais podemos constatar um sintoma de cansaço moral e de abatimento.


F. Myers também o reconhece: “Há como que uma inquietude, um descontentamento, uma falta de confiança no verdadeiro valor da vida. O pessimismo é a doença moral de nosso tempo”.


As teorias de além-Reno, as doutrinas de Nietzsche, de Schopenhauer, Haeckel, dentre outros, muito contribuíram para desenvolver esse estado de coisas. Sua influência se espalha por toda parte. Deve-se atribuir a eles, em grande parte, esse lento trabalho, obra obscura de ceticismo e desencorajamento que se desenvolve na alma contemporânea. É tempo de reagir com vigor contra essas doutrinas funestas e de procurar, fora da órbita oficial e das velhas crenças, novos métodos de ensino que respondam às imperiosas necessidades do momento presente. É preciso preparar os espíritos para as necessidades, os combates da vida atual e das vidas futuras; é preciso, sobretudo, ensinar o ser humano a se conhecer, a desenvolver, em vista de seus objetivos, as forças latentes que nele dormem.


Até aqui, o pensamento esteve limitado a círculos estreitos: religiões, escolas ou sistemas que se digladiam e se combatem reciprocamente. Daí essa divisão profunda das idéias, essas correntes violentas e contrárias que perturbam e transtornam o meio social.


Aprendamos a sair desses círculos rígidos e a dar livre expansão ao pensamento. Cada sistema contém uma parte de verdade; nenhum contém a realidade por completo.


O universo e a vida possuem aspectos bastante variados, bastante numerosos para que algum sistema possa abarcar todos. Dentre essas concepções absurdas, é preciso recolher os fragmentos de verdade que elas contêm, aproximá-los e colocá-los de acordo. Depois, unindo-os aos novos e múltiplos aspectos da verdade que descobrimos a cada dia, caminharmos rumo à unidade majestosa e à harmonia do pensamento. A crise moral e a decadência de nossa época provêm, em grande parte, do fato de o espírito humano ter se imobilizado durante muito tempo. É preciso tirá-lo da inércia, das rotinas seculares, levá-lo às mais elevadas altitudes, sem perder de vista as bases sólidas que vêm oferecer-lhe uma ciência engrandecida e renovada. É essa ciência do amanhã que trabalhamos para que seja constituída. Ela nos fornecerá o critério indispensável, os meios de verificação e de comparação sem os quais o pensamento, entregue a si mesmo, sempre correrá o risco de se perder.


Leon Denis - Paris, 1908

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Só neste trecho do livro temos toda a atualidade do pensamento de Leon Denis. Embora conservador com relação aos filósofos.


Lemos esse texto como se estivessemos lendo algo deste mesmo ano de 2013.


Por suas posições conservadoras sempre deixei de lado Leon Denis. O que prova que todo preconceito é uma grande imbecilidade.


Peço licença para ser imbecil. Bem me cabe esta pecha. Enfim a cada dia uma nova descoberta. Assim caminhamos.


Paulo Cesar Fernandes

21 10 2013

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