Deolindo Amorim
Entre Deus e César
Alguns livros nos chamam a uma práxis dos preceitos espíritas.
Este, de Deolindo Amorim me espanta pela sua clareza e a sua maneira de colocar
as ideias.
Concordar plenamente com ele?
Quase que sim, não fosse ele defender a Lei de Causa e
Efeito, algo inexistente no que se refere à ética. Perfeitamente admissível nas
Leis da Natureza, não se pode transplantar tais conceitos para o campo
vivencial ou existencial. Não mesmo. Equivoco do velho movimento espírita. Novos
pensadores já se libertaram dessas amarras.
Mas eu quero destacar um pequeno trecho do capítulo Entre Deus e Cesar onde ele aborda o
tema, a meu ver atirando em dois objetivos a um só tempo: de um lado o Estado
totalitário da União Soviética, e todo totalitarismo é realmente reprovável; e
de outro lado, criticava a sociedade capitalista da forma em que ela vinha se
estruturando. Ele apoiava os movimentos ocorridos no Maio de 68 na França.
Uma posição muito mais progressista que Alain Renaut e Luc Ferry
em seu livro “Pensamento 68”, na qual os autores apontam as mobilizações
estudantis e obreiras de Maio de 68, através de seus intelectuais, como desencadeadoras da sociedade
individualista na qual hoje vivemos.
Vejamos a posição de Deolindo. Separei o parágrafo em
trechos, diferentemente do que se encontra no livro, com o objetivo de permitir
ao leitor uma análise de cada trecho. Retirei os grifos deixando o texto limpo
para a livre apreciação do leitor, a quem, a meu critério cabe análise e
reflexão:
Seja qual for a condição social, a criatura humana tem aspirações que
não podem ser reprimidas por nenhum poder estranho: - o saber pelo saber, a
criatividade do espírito, o culto das expressões estéticas, a liberdade nas
preferências intelectuais. Sem o direito de escolha nas tendências vocacionais,
a civilização terá uma geração de jovens frustrados e recalcados. Os planos da inteligência
criadora na conquista do conhecimento não podem ser traçados pelo Estado.
E, se assim for, se continuar a interferência do Poder na formação da
cultura, impondo uma "profissionalização" absorvente para que haja
somente homens ''eficazes'', como acentuou o crítico da situação francesa de
68, a chamada civilização tecnológica chegará a ponto extremo de transformar o
homem apenas em robô, cuja função na vida é produzir, e produzir maquinalmente.
Então, a cultura já não teria o sentido de riqueza do espírito, uma vez
que tudo já estaria "programado", segundo a bitola do sistema
dominante. Tudo isto, afinal, significa a primazia da preocupação econômica sem
um padrão de ética.
Tais fenômenos, analisados à luz dos princípios espíritas, revelam uma
tendência ostensivamente prejudicial ao
desenvolvimento espiritual do ser humano, pois a cultura nunca deve ser
dirigida mecanicamente com o intuito de apresentar produção para fins imediatos
e predeterminados.
A cultura é opção do espírito, tanto
faz literária, quanto científica, filosófica ou artística. Por isso mesmo, em
concordância com o raciocínio espírita, entendemos que não se pode excluir a
ética das realizações econômicas, embora o fato econômico não se
confunda com o fato moral. A distinção entre Deus e César não exclui a responsabilidade moral nos empreendimentos do mundo.
Que possamos sempre ter em mãos livros capazes de nos orientar nos
rumos de nossa vida. Embora nunca tenhamos pastores ou senhores, pois não
podemos abrir mão de nossa liberdade de elaborar nossas concepções vivenciais, e
direcionar nossos pensamentos e atos. Tomamos as palavras de Herculano,
Deolindo Amorim e do próprio Kardec como elementos referenciais, mas nunca como
elementos mandatórios da nossa vida. Pois somos os únicos responsáveis por
nossos sucessos e insucessos.
Paulo Cesar Fernandes
19 06 2014
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